terça-feira, 28 de outubro de 2008

Histórias do Billi J. - a luta do Billi J. contra a ignorância(final)

(continuando)
Esse, vendo a obrigação do pedido, não disse nada. O idiota ameaçou bater no Billi J. se ele se recusasse a desculpá-lo. E o Billi J. continuava sem mencionar uma palavra sequer, mas não parou um momento sequer de recolher o lixo(claro que para isso ele andava, mas o povo, esperando uma briga, o seguia). Depois de muita ofensa, mesmo tendo a orelha puxada pela guria, o Billi J. resolveu dizer:

-Me deixe recolher esse lixo em paz.
-Aiaiai, para com isso Manuela - disse o idiota para a guria - não vê que ele quer que eu vá embora?!
-Então se desculpe seu asno!
-Me desculpa logo infeliz!
-Vai embora.

E ficaram nesse vai, não vai, manda, obedece, não adianta nada, até que, em determinado momento, o Billi J. o desculpou e o idiota foi embora. Após o ocorrido, a guria perguntou para o Billi J.:

-Por que você não bateu nele? Duvido que não tenha força para tal...
-Eu tenho que terminar de recolher todo esse lixo que os porcos imundos dessa cidade jogam no chão todos os dias.
-Ah, então você é lixeiro?
-Não.
-Então?
-Se depender da prefeitura para ter uma cidade limpa, viveremos sempre no lixo.

Após compreender a lição de moral, ela insiste:
-Mas por que não deu um soco nele? Ele mereceu...
-É seu namorado?
-Não.
-Irmão?
-Não.
-Última tentativa, primo.
-Não. Ele é apenas meu colega. Um idiota que acha que pode tudo. Merecia levar uma surra. Por que não fez isso com ele?
-Eu poderia lhe dizer muitas coisas, lhe dar uma lição de moral ou de grandeza, dizendo que não me rebaixo ao nível dele ou coisas do tipo, mas não quero.
-Então?
-Não bati naquele infeliz apenas porque se o fizesse teria que fazer com todos aqueles que fazem a mesma coisa que ele fez hoje. Com todos aqueles que, ao invés de ajudar, acabam sempre atrapalhando.
-E por que continua fazendo isso, mesmo sabendo que sempre será maioria a parte da população que atrapalha ao invés de ajudar?
-Não sei.
-Como?
-Não sei o porquê de fazer isso.
-Ãhn?
-Nem tudo precisa ter uma razão para existir.
-Mas nesse caso...
-O que ainda fazes aqui? Uma guria tão bem vestida deve ter um motorista à espera.
-Hahaha, tá me cantando então guri?!
-Ãhn?
-Confessa vai...
-Confessar o que?

Percebendo que o Billi J. não era como todos os idiotas que ela conhecia, continuou...

-Nada não.
-Então me deixe com o meu lixo e os meus pensamentos.
-Os pensamentos podem ser seus, mas o lixo não.
-Alguém tem quer dono dessa porcaria toda. Nunca leu "O pequeno Príncipe?"
-Sim, mas o que tem a ver?
-"...tu te tornas responsável por aquilo que cativas..."
-E tu por acaso considera esse lixo importante?
-Sim.
-Como?
-O lixo é uma prova de que alguma coisa está sendo feita, mesmo que essa coisa esteja errada.
-Hum... e?
-E eu faço isso muito mais porque me sinto bem recolhendo esse lixo e colocando nas lixeiras.
-Mesmo que os lixeiros joguem grande parte disso no chão novamente, pelo fato de os caminhões de lixo estarem sempre abarrotados de sujeira?
-É, nem tudo são rosas.
-Se você achar uma rosa aqui...
-Não se preocupe... eu guardo ela para você
-Ui...
-Mas você se sente bem recolhendo lixo mesmo?
-Algumas pessoas pintam, outras tocam algum instrumento, outras escrevem... eu ajunto lixo. Qual o problema?
-Você é o problema.
-E ainda por cima, como diria a minha avó, mente ocupada não pensa besteira.
-E o que seria besteira para você?
-Esquece, não te conheço para te contar a minha vida.
-A...

O Billi J. a interrompeu.

-Peraí!
-O que?
-Eu sou o problema?
-Sim.
-Nem me conheces e me chamas de problema, por que isso?
-Não sei. Você é diferente.
-Tá, se queres chamar os caras do hospício, anda logo...
-Hahaha, não vou fazer isso. Você é um problema bom.
-Ãhn?
-Sim. As pessoas lhe vêem como um problema pois sabem que há alguém que foge da hipocrisia rotineira de usar e jogar fora. Você é o problema para todos, inclusive para mim.
-E o que pensas fazer? Me matar?
-Não. Deves ter alguém que continuará o teu serviço. E vejo que você é teimoso. Então é mais fácil fazer outra coisa.
-O que?

Ela pegou um saco de lixo do bolso do Billi J. e saiu as catas de lixo, assim como o Billi J. estava fazendo. Ele então a indagou:

-Mas por que isso?
-Não sei...
-Como?
-Não sei... nem tudo precisa de uma explicação, não é mesmo?

E com um sorriso lindo, ela continuou a recolher o lixo. Ele também o fez, mesmo que não tivesse entendido muito bem o porquê de tudo aquilo. Talvez a vida solitária do Billi J. tivesse começado a mudar, porque, pelo menos naquele dia, ele não estava sozinho na luta que deveria, pelo menos na teoria, ser de todos.

*essa lição não deveria ter uma moral e o Billi J. deveria ter surrado o infeliz do plai... digo, do idiota daquele bocó de mola lá. Mas enfim, mais uma vez o Billi J. surpreende, mesmo sem ser muito surpreendente.

Um comentário:

Vini Manfio disse...

eu gostei disso