terça-feira, 26 de junho de 2012

Histórias de uma vida não vivida (49)


*Cansei dos otimistas, daqueles que acham que o copo está sempre meio cheio - ah, quanta bobagem em tão poucas palavras - e daqueles que querem ver sempre o lado bom das coisas. Aproveitar e desfrutar das derrotas, do sofrimento e da dor também é bom, é importante, é necessário. Entenda, não há masoquismo nisso, apenas a consciência de que nem sempre tudo está bem, tampouco algum dia tudo, sem exceção acaba por estar bem e bom. Sempre falta alguma coisa. Porém, o outro lado da corda também se encaixa nisso. Nunca tudo está ruim. Sempre há algo bom para ver, apreciar, desfrutar, viver. Não há otimismo nisso como não há masoquismo em saborear a derrota, não só para evitá-la em ocasião futura mas também, e mais importante ainda, para reconhecer-se como humano, falho, incapaz de, por si só, chegar à perfeição. Não há conformismo preguiçoso nisso tudo. O que há é a necessidade de que Alguém nos ajude a levantar e recomeçar. Por isso é necessário aprender a perder.

Nunca fui de dar ouvidos ao que os outros diziam para mim, mesmo pessoas queridas, próximas, familiares, tias babonas e, claro, minha mãe, para quem a minha existência não passa de mera formalidade daquele ditado que diz ‘durante a vida, plante uma árvore, escreva um livro e tenha um filho’. Por mais estranho que possa parecer, acreditei, dia desses, que os outros poderiam ter alguma razão sobre a minha trajetória nesse mundo. Por alguns instantes, mas acreditei.
Diziam-me sempre, de várias maneiras:

“Batalhe, mas espere com tranquilidade pois a felicidade um dia baterá à sua porta.”

Sempre tomei isso como uma bobagem positivista de pessoas que, por mais que tivessem boas intenções,  jamais levaram em conta todos os fatos transcorridos na minha vida. O pior dessa história chegou quando, em um daqueles acasos hollywoodianos, alguém quase espancou a porta da minha casa, dias atrás.

Atendi e, caramba, uma mulher muito bem vestida, extremamente atraente, olhos claros, sorriso brilhante, estava ali, parada, a esperar-me. Primeiramente, claro, não consegui sequer abrir a boca para pronunciar, parecia que... banal mas sim, parecia que a morte havia chegado mais cedo e agora estava pisando no céu. Depois, consegui pronunciar um:

- Oi?

- Oooooooooooooooi!

E ela sorriu. Ainda mais. Pensei que, se estivesse humanamente vivo, ali morreria porém, para minha infelicidade, continuava vivo.

- ... – hesitei, não sabia o que dizer.

- Quer me dizer alguma coisa?

- Quem é você?

- Eu sou a felicidade! – e conseguiu o que eu jamais imaginaria: aumentou ainda mais a intensidade daquele sorriso.

Agora entendem por que acreditei que a felicidade havia batido à porta, como todos haviam dito, certo? Então, a história continuou quando eu... bem, o diálogo fala – sem redundância – por si.

- Quem?

- Felicidade.

- De que?

- O que?

- Felicidade do que?

- Sua felicidade! – e não parava de sorrir, sem parecer falsidade. Aquela simpatia era... bem... muito... enfim.

- Minha? Não, quero saber seu sobrenome.

- Não tenho sobrenome. Me chamo felicidade, e sou sua.

Antes de continuar, é bom deixar claro uma coisa: isso não é um sonho erótico escrito por um garoto de 15 anos incansável na busca por um beijo na boca. Tampouco é o roteiro de uma comédia do Chris Rock ou do Adam Sandler. E não, eu juro, isso não é mentira!

- Minha?

- Sim! Você lutou, buscou, fez o possível e agora estou aqui porque você merece ter a mim em sua vida.

- Cadê a câmera?

- Que câmera?

- Isso só pode ser pegadinha do programa do Sílvio Santos ou um novo quadro do Pretinho Básico.

- O que é isso?

- Ah, deixa pra lá. Sério, que brincadeira sem graça é essa que aqueles chupadores de manga dos meus colegas de trabalho aprontaram? Quanto te pagaram para vir aqui tirar sarro da minha cara?

- Não estou entendendo. – e parecia realmente perdida com as minhas palavras.

- Não é brincadeira?

- Não.

- Ninguém te pagou, mesmo?

- Claro que não. Você mereceu, agora me tem por inteira. Não há pagamento, dinheiro, etc. Há apenas a sua recompensa por tantas horas de dedicação às coisas boas.

- E porque ela não veio em forma de um bilhete premiado da mega-sena?

- Você preferiria que fosse um pedaço de papel no meu lugar?

Insisto, não há nada de erótico aqui. E mais, olhava para ela que me arrependi por ter mencionado o tal bilhete. Ela era simplesmente parte de um sonho. E claro, de uma Ferrari dirigida por um jogador de futebol.

- Não, eu acho que não. Era só para saber se era verdade.

- A felicidade bateu na sua porta, deixa ela entrar, vai?

Me rendi. Sorri e...

- Claro, me faça feliz, felicidade!

Pessoas como eu merecem, mesmo, que coisas como estas aconteçam.

- Haha, otário. Acorda para a vida maníaco solitário.

-  Ãhn?

Ela puxou a porta, fechando-a na minha cara. E saiu.

Não sei de onde veio, quem era, quem idealizou aquilo ou... se filmaram ou não. Em todos os casos, escrever isso garante que, se virem por aí um vídeo com uma pegadinha dessas, vão poder perceber que talvez eu tenha sido... inocente demais, achando que... bom.

Muitos haviam me dito que a felicidade bateria à minha porta então... não custava tanto assim acreditar, embora tenha hesitado um pouco mas... sim, pode rir porque...

... a felicidade bateu na minha porta e me chamou de otário.

E eu continuei aqui, sem entender nada.

sábado, 23 de junho de 2012

Pedaços de um pensamento (48)


Já não sei o que dizer. Negar tristeza em potencial antevendo um futuro, provavelmente, próximo seria como fazer de conta que tudo está bem e que aquela mania de achar que poderia ser diferente é parte de um tolo passado. Somando-se a isso uma preocupação antiga, escondida há tempos por motivos impessoais, tem-se uma pequena fagulha de caos aproximando-se de um caótico sistema mental. Ou algo próximo.

Tornou-se um prazer às avessas fazer de conta que engano com manifestações formadas por palavras pouco diretas, nada - aparentemente - sensato e real. Entretanto não é tão divertido, e tampouco prazeroso, quanto era criar sólidas barreiras verbais, dotadas de espantosa e eficaz subjetividade que não levava a lugar algum, fosse de entendimento, compreensão ou mesmo analogia. Essa era a intenção e, portanto, independentemente da qualidade definitiva, aquilo que saía como sopro de cansaço alcançava seu objetivo, sendo assim um sucesso relativo em meio a pequenos e, hoje, não muito significantes fracassos.

Mentiria, de maneira descarada e egoísta se trouxesse à tona termos como 'jamais', 'sempre assim' ou o badalado 'quem me dera' seguidos de lamentações, nostalgia e utopias características de épocas menos nobres, pessoais e, sem dúvida, mais vazias. Escrever por escrever deixou de ser uma opção quando nem isso passei a ser capaz de fazer. O que outrora necessitava de inspiração - e ela vinha mesmo que os olhos não piscassem (mas quando piscavam...) - hoje necessita de... o que mesmo? Intensidade? Espontaneidade? Sinceridade?

Não.

Necessita de verbos no infinitivo.

O que também é uma grande bobagem quando há tantos passando, vagamente, por aqui. Inconformado e, concordo, chato sou nesse quesito. Sempre quis mais. Quase sempre busquei mais. Poucas vezes consegui. Não, aquela mania de perdedor já não existe mais, tampouco palavras derivadas de sua presença. O que acontece, e agora o infinitivo é explicado, é que...

... ah, você sabe. Seja lá quem seja você que está com os olhos procurando respostas que não vai encontrar. Ou explicações para o que não se pode explicar com palavras.

Sim, estou sorrindo. Não é mentira. Muito menos somente aparência. Estou sorrindo porque...

... as lembranças foram renovadas.

Não, preocupar-se com a possibilidade do esperançoso não é uma opção. De tantas que existem, essa está descartada. Não porque perdi, porque sou um perdedor, porque o mundo conspira contra ou deixei de acreditar... em que mesmo? 

Ah, sim, naquela coisa que deixa as pessoas mais bobas e o mundo menos monocromático.

Alimentar alguma esperança está fora de questão. Estar feliz mesmo com a potencial tristeza que iniciou essas palavras é possível, sim. Em uma vida de possibilidades, o impossível existe para provar que não há razão que defina algo que... com a razão não se explica. Estou feliz, e sorrindo, mesmo que saiba o quanto, potencialmente, estou propenso a ficar triste.

E isso é bom porque, de fato, não sou eu quem deve estar feliz com o que pode vir.

Renovou as minhas lembranças e, com isso, de um jeito bem... inexplicável, renovou o meu sorriso.

O que virá depois... será escrito depois.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

Histórias de uma vida não vivida (48)


*Às vezes as coisas acontecem em um piscar de olhos e nem nos damos conta de que nunca mais acontecerão. Só percebemos que foram pontualidades boas quando temos vontade de passar por aquilo novamente. É como comer uma maçã e procurar o gosto dela em todas as outras maçãs. Fosse pela safra ou mesmo pela árvore que fê-la crescer, nenhuma maçã parecerá ser Aquela maçã. Pontualidades, gastronômicas, sociais, afetivas. São várias. As coisas acontecem e... pronto, já aconteceram. Algumas se repetem, outras não. Por que então é costume sentir saudade e querer mais apenas do que, no fundo, sabemos que não teremos mais? Mania de inconformismo, de nostalgia ou para ter do que reclamar. Talvez haja um quarto motivo, mas esses já abrangem a grande maioria dos casos. E daí? Não importa mesmo se eu digo isso, uma vez que você não vai deixar de querer provar uma maçã igual Àquela.

Dia desses... bom.

Estava dormindo, acredito que profundamente, quando... quando aquele celular velho e capenga começou a tocar. Eu não sei ao certo que horas eram porque... bom, aquele celular estava tocando e eu estava... é, estava dormindo. Quem foi o idiota que deixou o celular ligado de... bom, deixa para lá.

O fato é que o celular tocava e eu tentava... acordar... para atendê-lo mas, pensando bem, quem poderia estar ligando a essa hora? Virar para o outro lado e continuar dormindo seria uma boa opção pois, se alguém reclamasse que não atendi o celular no meio da madrugada, poderia dizer que estava no silencioso e, portanto, não teria culpa por não ter atendido, digo, não teria sido intencionalmente.

Seria uma mentira porém pequena, já que não faria mal a ninguém... então porque resolvi atender o celular?

Ah, sim, o outro lado. E se alguém estivesse precisando? Tenho a mania de querer ajudar as pessoas e de me preocupar com... blá blá blá, discurso de gentinha politicamente correta, apesar de ser uma verdade.

Então atendi.

- Alôoooooooooooooo. - Alô com bocejo (acho que nem precisaria explicar).

- Vem para cá agora.

- Ãhn?

- Acorda, joga uma água gelada nesse rosto e vem para cá agora.

- Quem fala?

- Sou eu, não se faça de desentendido, venha para cá agora.

- Mas quem está falandoooooooooo? - mais um bocejo verbalizado.

- Sou eu.

- Eu quem?

- Hahaha, engraçado.

A pessoa não parecia muito feliz, fato.

- Sério, estava dormindo, quem é você?

- Não seja idiota. Preciso de você aqui agora. Se você não vier, nunca mais falo com você.

- Chantagem a essa hora da madrugadaaaaaaa? - se não fosse verdade, esse terceiro bocejo talvez convencesse a pessoa de que eu estava com muito sono e, antes de atender o celular, dormindo.

- Chega, estou esperando você.

- Onde?

- Você sabe, aqui em casa. Agora. Se não vier logo, nunca mais falo com você, entendeu?

- Mas eu não..

E desligou.

Larguei o celular no chão e voltei a dormir pois, de fato, estava com muito sono. O problema... bom, acho que por ter caído no chão aquele celular não funcionou mais. Talvez tenha sido por isso. Talvez tenha sido o destino que... bobagem. Não descobri quem era. Estava com tanto sono que não sei dizer se era homem ou mulher mas, se fosse ganhar dinheiro apostando, jogaria toda a minha fortuna de dezessete reais na segunda opção porque... bem, admitam, há uma paranoia em volta desse 'senão nunca mias falo com você'. Paranoia, possessão, chantagem, sei lá, alguma coisa assim.

O que me entristece, hoje, é concluir que, de fato, tenho uma pessoa que fala a verdade a menos no meu... círculo social? Não entendeu?

Se ela disse que nunca mais falaria comigo se eu não fosse, bem, ela estava falando a verdade, pois nunca mais falou uma vez que ninguém veio me dizer que estava 'irritada', 'possessa' ou... sei lá mais o que, comigo, por não ter ido a algum lugar. O fato de o celular ter estragado ajuda. Ainda mais quando não mandei consertá-lo e não comprei outro, ainda, por não querer mais ser acordado de madrugada.

Nem venham dizer que eu poderia 'colocar no silencioso' e blá blá. Se existe celular é para ser ouvido.

E ponto.

domingo, 17 de junho de 2012

Pedaços de um pensamento (47)

Sinto falta daqueles momentos em que, pouco tempo atrás, pouco ou nada pensava para falar. Não que fosse impulso descontrolado mas sim um gesto espontâneo de felicidade. Singela felicidade. Tão fácil, tão simples, tão espontâneo. Nada antes tinha me instigado a dobrar uma folha de papel de maneiras ordenadas para formar uma coisa que nem saberia direito definir o produto final.

E agora?

Sinto falta. E parece que quanto mais me esforço para retomar um ponto perdido mais perdido acabo ficando, eu, com relação a tudo. Não só o pontual como o geral. Em mim, nada muito concreto. Na razão da falta, nada conhecido. É como se aquilo tivesse sido um sonho e agora a realidade estivesse sendo vivida.

Nem sei mais o que pensar. Como tentar viver novamente o que tanto bem fez, ao menos a mim. No meio do meu deserto, a lembrança do sorriso leve, do carinho, do olhar.

Importa se ainda me preocupo, se ainda tento fazer alguma coisa - do meu jeito desengonçado - para que aquilo não tenha sido apenas uma nota de rodapé? Importa se correr qualquer distância é detalhe e se o desejo era estar perto, e não longe?

Eu me importo. Isso foi e é importante para mim. Não sei o que está acontecendo, também não tenho tido como saber, uma vez que não sei o que dizer, sequer perguntar.

Porém, estou triste por estar distante e porque parece que só eu me importo com aquilo.

Aquilo que hoje não pode ser chamado de isso. Infelizmente, mais uma vez.

*mais uma noite de insônia virá.
Ao menos hoje é domingo.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

Ecos da sinceridade - Em meio a um deserto


Felizmente - relativamente falando porque acredito ser essa uma situação pontual - nada do que poderia fazer-me perder a noção de linearidade está conseguindo-o. Refuto a tese de fins que justificam meios porém, paralelo a isso, existem momentos que sobrepõem outros momentos e razões mais relevantes que outras o que, nesse caso, acaba sendo bom para evitar uma nova destruição em massa.

Sem precisar sair do sofá.

Teria sentido, dias atrás, lamentar muito por ter estado tão perto e ainda assim, pontualmente, não ter razões para sorrir. O significado global é superficial demais porém, seria hipócrita se negasse, incomoda. Pouco ou muito, dependendo de uma série de fatores. No meu caso, não incomodou embora devesse fazê-lo muito mais do que nas pontualidades de anos anteriores. Retirar-me da lista daqueles que lamentam para, sem muita explicação, deixar de fazer parte de toda e qualquer lista acabou sendo oportuno.

Bastante oportuno.

Admito, também, que mesmo que esteja sendo bom ter um deserto para não viver uma decepção - grande ou pequena, dependendo do ponto de vista - gostaria de estar vivendo outro momento, outra fase, outra situação que não essa. Passar por uma certa indiferença a tudo - na verdade, a quase tudo - novamente não anima. Foi, passou e, de outra maneira, voltou. Talvez seja sinal de que nem tudo foi entendido e superado.

Ou talvez seja sinal de que ainda sou incapaz de lidar com determinada situação.

Foram tantas semelhantes, próximas mesmo, que acabei dando-me a cômoda ideia de que estava capacitado a tudo que tivesse relação com. Aquilo, isso, sei lá, provavelmente não citei nada anteriormente. Acomodei-me esperando qualquer bomba cair e o fato de não precisar enfrentá-las por estar perdido em um deserto seco e, à noite, frio, talvez seja, de fato, um indício de que ainda há o que melhorar.

Entretanto, perceber que ao redor falta (talvez) muito mais e, ainda assim, não há preocupação com dar um significado pleno àquilo, desanima, sim, seria hipócrita também ao afirmar indiferença, por isso não o faço mas, também não tenho razão para mentir, essa forma infantil de orgulho desaparece quando penso que esse é o caminho a ser percorrido.

Queira ou não.

Longe disso, não haveria muito significado, sei bem.

Caminho, sozinho, um pouco perdido, um tanto desanimado e muito distante de lugar algum. Para a minha tranquilidade, não falta Luz. Nunca falta Luz.

Preciso voltar. Às palavras, aos pensamentos, aos sorrisos, aos sentimentos...

... e aos sonhos.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Histórias do Billi J. - Estranho

"Estava sentado, sozinho, em um dos bancos, com um livro nas mãos, isolado de todo aquele barulho que havia ali. Lá. Em todos os lugares a minha volta. Como um gênio incompreendido, estava distante de um mundo ao qual, de fato, nunca pertenci e do qual, não por menos de sessenta razões, não queria pertencer. A minha leitura, aquelas palavras e a certeza de que a espera acabaria em alguns minutos ratificavam minha escolha.

Como nada na minha vida é básico, e você sabe bem disso, algo estranho, pontual, aconteceu.

Ela era loira, deveria ter uns 20 anos, alta, usava uma daquelas botas de couro que só filhas de pais ricos usam, e estava com um café nas mãos. Não sei dizer se era bonita ou não porque, na verdade, quando a olhei, já estava sentada ao meu lado e somente seu cabelo pode ser visto pelo canto do meu campo de visão. Sorvia um café com regularidade, logo após um pequeno sopro. Não sei se fez algo além disso porque, como disse, apenas a olhei de lado. E meu livro estava bem mais interessante.

Não tenho muitas relações sociais e, embora a Renata me apresente várias pessoas todas as vezes que saímos juntos, não mantenho contato com nenhuma delas, deles, enfim. Confesso que senti-me um mau educado porém não fazia muita diferença, aquelas pessoas geralmente me olhavam de cima a baixo procurando defeitos em minha aparência e no meu tortuoso jeito de andar.

O fato é que essa pessoa sentou ao meu lado, do nada, e começou a conversar. Estranho, achei que pediria alguma ajuda em trabalhos da faculdade ou informações sobre a previsão do tempo até o final da semana entretanto, para minha surpresa, conversava tranquilamente, sem pedidos ou afins, comentando sobre as últimas notícias no mundo, política e até mesmo futebol.
E foi falando. E o livro parecia cada vez mais distante da minha atenção. Ela falava bem, com calma e português impecável.

Talvez fosse a exceção de uma regra quase absoluta naquele ambiente... sem adjetivos.
Então, assim como chegou, saiu. Despediu-se, também com educação, e dirigiu-se a algum lugar. Não acompanhei-a com os olhos porque, apesar da surpresa, não achei que aquilo significasse grande coisa. Talvez por tudo que aconteceu anos atrás, talvez porque não tenha mais paciência para aproximar-me amigavelmente de alguém, talvez porque estivesse preocupado com o que poderiam inventar para a Renata, não sei. Muitas possibilidades passaram pela minha cabeça.
Continuei a ler mas, algumas frases depois, parei.

Senti-me então, como naqueles filmes da Sessão da Tarde, onde há uma aposta entre dois sujeitos para levar uma menina feia e desengonçada para um baile. Sou feio e desengonçado, ou seja, não sou do tipo que as pessoas querem conhecer. Ela era loira – e isso não é provocação! haha -, falava corretamente e tinha opiniões sobre acontecimentos mundanos e esse rebuscamento, mesmo que parcial, diminui ainda mais a possibilidade de interesse dela por conhecer-me.

Mas... é estranho.

E... que baile?

B. Johansson"

sábado, 9 de junho de 2012

Histórias de bergamota(19)

"Diz aí, quando você me viu triste? O que, muitas vezes? Mentira. Não consigo demonstrar tristeza, minha existência representa um sorriso sempre, cada pedaço de mim tem a forma de um sorriso, leve, discreto e nem sempre de felicidade mas, ainda assim, um sorriso. Como teria você me visto triste? Não existe possibilidade disso acontecer, não existe acaso em que, por descuido, o meu ser tenha deixado de ser um sorriso. Sinto muito, essa história de 'comigo foi assim' não existe, você não é mais ou menos do que ninguém para ser a única que viu tristeza em mim.

O que, você foi tirando meus pedaços e segurando-os de cabeça para baixo, assim parece a feição de uma boca triste?

Você tem problemas, precisa de um psicólogo ou de um psiquiatra. Bergamotas são, por inteiro, gomos em formas de sorrisos. Sorriso traz alegria, mesmo que eu, por mil e um motivos, não tenha motivos para sorrir.

Foi longe demais. Virar partes de mim para dizer que a tristeza era parte de mim foi um exagero. Complexo e desnecessário exagero.

Estava cheia de sorrisos, não de tristezas.

Admita, você tem problemas.
Ass. Srª Berga Allegri Mota"

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Histórias de uma vida não vivida (47)

*Ninguém, possivelmente, entenderá quaisquer motivos, se é que existem. Há coisas que, quando superam o nível consciente e passam a ser gestos espontâneos, tornam-se conquistas que dificilmente serão desperdiçadas. Por mais que ninguém do mesmo nível existencial veja, alguém em outro Nível, distante da razão, sempre vê. Nada é feito para isso porém, não há sentido em querer fingir que aquilo que é, ou que passa a ser pela repetição - obtida apenas pela vontade aliada à persistência -, é feito apenas por si. A justiça, a verdade e tudo o que é significativo, quando vividas apenas por si, perdem seus significados essenciais. A bondade e todas as formas de amor, também. Tudo tão confuso... e ao mesmo tempo tão simples.

Mãos no bolso, pensamentos vagos e passos apressados. Chegar em casa, jantar, estudar e ver os últimos cinco minutos do jogo... bom, em resumo era isso, mas os pensamentos se desenrolavam na seguinte ordem.

O que preciso fazer, agora:

Chegar em casa... ah, será que ela já voltou de viagem? Tá, depois de chegar em casa, preciso jantar, pois estou com fome e... bah, seria bom se pudesse repetir aquela noite em que jantamos aquele, como era mesmo o nome... enfim, aquela coisa parecida com salada, como me diverti... ah tá, para. Jantar e depois estudar... hipocrisia, não consigo me concentrar enquanto ela não... eu PRECISO me concentrar! E, se o estudo render... hipocrisia de novo... vejo o finalzinho do jogo e os gols da rodada.

Sendo assim, não prestava atenção nas dezenas de pernas desnudas que passavam rente às suas, em meio a uma multidão sedenta por uma das tantas festas citadinas da noite. Era estranho, fosse quem fosse, conhecida ou não, não era alvo de olhares desesperados, como os que aqueles dois marmanjos na moto desferiram a recém. O problema é que o motorista quase entrou reto no prédio enquanto... quem se importa também?

Depois de assistir o jogo vou dormir e...

- Ao dobrar na esquina da rua onde morava, o choque inesperado e inocente, livros ao chão e um rosto apavorado com... o que? -

- Desculpa, não tive a intenção de esbarrar em você. Deixa eu te ajudar a recolher os livros.

- Não, não.

Ela tentava agarrar aqueles livros de qualquer jeito, como se estivesse correndo risco de morte permanecendo na minha frente.

- Eu não vou fazer nada, só quero ajudar.

- Não precisa, não precisa.

Não olhou para mim. Não aceitou minhas desculpas e sequer me permitiu ajudá-la a recolher o seu material caído no chão. Quando minhas mãos se aproximavam de um livro, ela antecipava e puxava-o para perto de si, recolhendo-o então.

- Você está bem?

- O que?

- Perguntei se você está bem.

- E por que você se importaria?

Poderia mandá-la pastar, ir para o raio que a partisse mas... não.

- Eu só queria saber se poderia ajudá-la.

- Não, não pode. Ninguém pode.

Recolheu o último livro e, ainda sem dirigir os olhos em minha direção, seguiu seu caminho, como se estivesse fugindo de alguém - talvez não fosse eu o causador do medo - ou atrasada para algo muito importante - que não seria uma prova, pois eram quase 11 horas da noite.

Quando coloquei minhas mãos no bolso, percebi que ela havia esquecido um pequeno bloco de notas, ou não havia visto-o no chão. Recolhi-o e fui atrás dela para devolver-lhe. Acelerei meu passo e, quando emparelhei com seus passos, falei:

- Você esqueceu isso. - entregando o bloco de notas.

Sem me olhar, esticou a mão direita, pegou o bloco de notas, colocou em cima dos outros materiais e seguiu, não sem antes perguntar, novamente:

- Por que?