domingo, 28 de agosto de 2011

Reflexões de um maluco (17)


Mantendo o ritmo egoísta de escrever que dá a impressão de que o centro do meu mundo é o meu umbigo, continuo naquela toada de analisar fatos do meu cotidiano de uma maneira, talvez, bem racional. O que não faz diferença alguma, antes de mais anda.

Se fosse atender aos meus instintos mais profundos, escreveria um texto todo em letras maiúsculas, direcionado a uma pessoa específica que, como quase todas as pessoas do mundo, não irá lê-lo. Não é só por isso que não escrevo com agressividade e impulsividade sensacionalista. Tampouco quero provar que a pessoa estava errada ou que não passa de, mais uma, que não possui nada além de vermes inúteis na cabeça.

Expondo sarcasticamente algumas opções, o ocorrido que me leva a escrever teve acontecimento ontem pela manhã. Cedo. Com sono por aquela, e tantas outras manhãs seguidas de períodos curtos de descanso, não avaliei bem as consequências da sinceridade que estou tentando colocar ao limite máximo da possibilidade dentro do meu dia a dia( que, segundo o corretor do google, não possui mais hifens entre si).

Não há arrependimento pelo resultado final em si, embora esse não seja satisfatório, o que mais incomodou nessa relação sinceridade x escolhas foram as palavras ditas por aquela pessoa. Geralmente, psicólogos sabem do que estão falando, avaliam em vias gerais determinados comportamentos e conseguem explicar, com um tanto de verdade, as razões para tudo aquilo.

Porém, não foi o que aconteceu ontem, comigo.

Aquela psicóloga malemal ouviu sobre mim, sobre a minha vida, o que penso, o que sinto e o que me leva a separar o joio do trigo dia pós dia. Uma frase sobre o meu passado e pronto, já fui considerado incapaz de lidar com algumas situações. Dizer que reprimo minha raiva e controlo meus impulsos foi transformado em um 'você tem um comportamento EXTREMAMENTE agressivo'. Esse extremamente foi bem frisado por ela, me levando a pensar, já sozinho minutos depois, se eu possuo mesmo um gênio extremamente agressivo.

Não interessou dizer, sinceramente, que nunca bati em ninguém, que nunca discuti em público por motivos importantes, que não uso drogas e que tento corrigir meus defeitos a cada dia. Tudo isso é verdade mas foi ignorado por uma pessoa que viu em mim um assassino em potencial, um psicopata reprimido por uma sociedade... peraí, se a tivesse mesmo influência no meu comportamento, seria para aumentar os meus níveis de stress, raiva, agressividade e intolerância aos diferentes, e não o contrário.

Tem mais. "Você é muito rígido para com as próprias atitudes e isso potencializa o seu gênio agressivo e impulsivo". Como alguém pode dar um diagnóstico desses ouvindo frases como 'para descansar, gosto de ler, de ver futebol e de escrever, ah, até tenho um blog'? Como alguém pode me dizer o que eu sou capaz de fazer se sequer sabe por quais valores prezo?

Sinceramente, fiquei irritado com isso, mas só depois que saí daquela conversa. Na hora tentei entender o que ela dizia e, agora, vejo que ela não disse nada com nada e fez uma avaliação precária e incorreta, baseada em riscos verticais do mesmo tamanho e pequenos adjetivos em frases curtas. Poderia ter mentido e dito coisas que encheriam aqueles ouvidos de ânimo. Talvez o diagnóstico fosse menos superficial.

Bom, paciência. Nem vou comentar o "você é incrivelmente emotivo e não sabe lidar com isso pois é muito inseguro e leviano em situações que exijam de você firmeza sentimental" logo após ter dito que eu me cobrava na faculdade muito mais do que os meus pais me cobram.
Essa é a grande prova de que a famosa frase dita por algum filósofo desocupado que diz que "Você é o que os outros vêem" não passa de algumas palavras que juntas dizem tanto nada quanto a frase "Ãhn, pode ser que sim, pode ser que não".

Ponto.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Pedaços de um pensamento (23)


Não abri a janela hoje, ao acordar. Poderia apenas ignorar isso e seguir em frente como se isso não representasse nada. A última vez em que caminhei para fora de casa apenas para sair de casa faz tempo, nem lembro mais quanto. Embora não esteja reclamando, coloco muitas negações em frases que não fazem sentido quando você não entende o que está acontecendo. Colocar uma frase do Pablo Neruda no twitter indica, no mínimo, que você está à beira de uma terrível depressão. Nada contra mas, ele é poeta, clássico e foi o único que conseguiu instigar minha vontade de escrever. Contraditório ou não, não estou novamente à beira do fundo do poço, ou quase lá de fato. Mas é estranho que alguém que não goste de poesia ache incrivelmente adequado colocar a frase de um poeta clássico. Sobre saudade, silêncio, não posso continuar jogando para o vento, e para esses cabos da internet, a responsabilidade inútil de levar adiante parte dessa complexa rede de sensações e sentimentos que passam por mim a cada pensamento que tenta fugir a condição de inútil ou simplesmente habitual.

Chega, minha boca tem gosto de pasta de dente e eu preciso trabalhar.

terça-feira, 16 de agosto de 2011

Histórias de uma vida não vivida (38)


*Quando opta-se por escrever sem inspiração acaba-se correndo o risco de transformar uma ideia em banalidade. Um propósito em perda de tempo. Uma vontade em fracasso. A opção é de risco porque, ainda que anos-luz de distância do ponto inicial da principal inspiração, tende-se a imaginar sem nada concreto para transformar algum pouco de ar invisível em um vento, ainda invisível mas, perceptível. Como tudo o que não se vê, dificilmente é definido, e quando, passado o estágio de sensação, torna-se sentimento, não há nada mais a fazer a não ser deixá-lo como fonte de inspiração, de criação e de todo e qualquer sorriso bobo diário. Nada disso, ou daquilo, me pertence, a vida deixa mais claro a cada dia. Entretanto há uma benção, que me é dada todos os dias e que me leva a acreditar que, mesmo não tendo comigo quase tudo, posso sentir felicidade.

Abrir os olhos parecia impossível. Era muita luz em cada milésimo de segundo transcorrido. Minha cabeça voltava-se ao chão sempre que meus olhos insistiam em mostrar que não conseguiriam ficar abertos naquele momento, com toda aquela luz forte que brilhava sem pensar no amanhã.

Porém alguma coisa fazia com que minha cabeça voltasse a ficar em sua posição normal, olhando para frente em busca de uma simples possibilidade de ver o que estava acontecendo. Nada mudava, a luz parecia cada vez mais forte e, com a provável ajuda de todos os elementos da face da Terra, tomava um espaço que não poderia ser calculado, tampouco imaginado.
Enquanto minha mente e meus olhos lutavam para ver quem decidia para onde minha cabeça ficaria voltada, se para o chão ou para frente, tentei entender porque ainda estava ali, permitindo que uma briga intensa entre o óbvio desejo de recuar e voltar às sombras era  combatido pela insana vontade de receber cada vez mais daquela luz, embora isso levasse a uma dor pontual em cada olho.

Os segundos tornaram-se minutos e por muitos deles fiquei ali, ora tentando olhar para frente ora olhando para o chão, tentando amenizar a dor que a luz forte forçava aos olhos. Sem qualquer lágrima derramada, sem qualquer arrependimento por alguns instantes de dor e alguma fraqueza. Incrível como um ser humano pode ser teimoso quando quer descobrir alguma coisa.

Por que eu ainda estava ali? O ambiente frio e sombrio longe daquela luz, que agora também era calor, parecia implorar-me, como o mal implora pela volta do pecador que busca conversão. 

Alguns minutos mais e nenhuma dor era mais sentida. Meus olhos agora olhavam para frente sem receio e podiam ver que um céu azul com nuvens brancas e um ponto amarelo irradiante eram a razão daquela persistência em não voltar à escuridão.

Dói, é difícil e a vontade de voltar ao comodismo da escuridão, da exclusão e de alguma outra forma de sombra,  pesam bastante e muitos desistem logo em seguida.

No final, vale à pena qualquer esforço, por teimosia ou com alguma dificuldade, quando há um dia bonito lá fora, mesmo que o Sol nem sempre brilhe.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Pedaços de um pensamento (22)


A chuva que começou tão fina e escassa aos poucos foi ganhando intensidade e chegou ao ponto de tornar-se marca no dia. Nesse dia tão disperso e sem sentido. A escolha de não esperá-la passar e evitar que as roupas, a carteira e o celular, já desligado, ficassem molhados mostrou-se um grande acerto, uma escolha boa, realmente boa. Optar por não fugir de um destino indiferente à própria e singela existência demostra tanto nada quanto muito. Contraditório por relatar, antes do lado bom, que alguma coisa ruim deveria acontecer para que uma boa pudesse acontecer. Talvez nada tenha acontecido em si porém a lamentação pelos poucos pensamentos lembrados demonstra que, mesmo que insignificante, alguma coisa teve sentido nessa chuva.

Os olhos não viam muita coisa, os carros passavam e nem tentavam evitar as poças que jorravam ainda mais água por cima de alguém que não estava mais preocupado consigo, humanamente falando. Gripe posterior ou alguma outra consequência negativa da escolha simples de dizer 'então vou com chuva' tornam-se nada, como esse tanto disfarçado de nada por palavras. Ah sim, importante dizer que são apenas palavras.

Queria poder dar um sentido ao que senti. Nada mudou, ainda assim vejo essa chuva como algo significativo. Poderia escrever uma lamentação rimada em prosa curta e figurativa entretanto não consigo. A verdade e tudo o que há continuam e nenhuma chuva poderá levá-los consigo. Também não há salvação para a sensação de que muita coisa está ruindo.

Para aqueles que parecem estar mais longe, para a singular destacada em meio àquele plural e em tudo o que torna-se cada dia mais difícil, prometo tentar e fazer o possível para não ser apenas como alguém na chuva, que se molha mas logo está seco novamente. As marcas importantes são aquelas que ficam para sempre e lutar pela eternidade particular não é egoísmo, não é arrogância, tampouco vontade de perturbar.

É, antes de qualquer coisa, demonstração de coerência para com tudo aquilo que hoje é lembrança.

Ao tempo, o tempo. Às palavras, tudo, menos entendimento.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Histórias de uma vida não vivida (37)


*Entendi que sob a luz está tudo o que se pode descrever. De olhos fechados não há descrição pois não há luz, logo não se pode ver. Apenas os outros sentidos valem quando não há luz. Descrevendo apenas o que se sente, quando possível, dá-se a mais simples forma até mesmo às mais complexas sensações. Quente ou frio, forte ou fraco, grande ou pequeno, redondo, quadrado ou triangular. Amor, raiva ou decepção. Então, olhos fechados para aquilo que não quero lembrar e tudo talvez seja mais simples.

- Olha ali embaixo!

- Onde?

- Ali, ali, lá...

Ela parou.

- Não, continua caminhando...

- Por quê? Não estou vendo nada.

- Continua caminhando que vai ter sentido.

Ela voltou a caminhar.

- O que você quer que eu veja?

- Olha para o chão, olha para os detalhes desse piso.

- Então eu tenho que parar e prestar atenção!

- Já disse que não, continua caminhando, já disse que parada você não vai entender!

- Está bem.

- Agora você está vendo?

- Só vejo os detalhes do piso da calçada.

- Reparou na luz?

- A do poste?

- A que vai mudando de lugar, refletindo de um jeito diferente no piso a cada passo que você dá...

- Ah, era isso... agora entendi.

- E aí?

- Sabe, é legal. Cada piso diferente, cada tipo de piso nas calçadas dão um reflexo diferente e os detalhes são...

- ...diferentes!

- É! Isso é legal mesmo. Como você consegue?

- Como eu consigo o que?

- Descobrir coisas legais em coisas simples.

- Talvez seja inspiração por você estar aqui comigo.

Ela parou mais uma vez.

- Você é estranho.

- Por que?

- Geralmente pessoas inspiradas criam alguma coisa e não ficam reparando tanto em detalhes.

- Você sabe que não sou detalhista.

- Sim, por isso não faz sentido logo você ter reparado em uma coisa tão simples, e tão legal quanto os diferentes reflexos das luzes da cidade nos pisos das calçadas.

- Obrigado.

- Ah, eu não quis dizer que...

- Você quer inspiração com palavras? Achei que nada do que eu dissesse lhe importava mas...

Ele fez um gesto com a cabeça para continuarem andando. Uma finíssima garoa começava a cair.

- Pega.

Ele tirou o moletom e colocou sobre as costas dela.

- Não quero que você fique gripada.

Ela sorriu. Eles então voltaram a caminhar.

- Você ia me dizer alguma coisa.

- Ah sim, as palavras.

- Não precisa dizer nada, eu não quis mesmo...

- Agora precisa.

Ela não desviava o olhar dele, aquilo talvez viesse a ser engraçado.

- Caminhamos sobre o piso e as luzes se transforam. Cada detalhe gera uma nova imagem, cada pequeno fim gera uma expectativa sobre um novo começo. Quem sabe a vida seja assim, como as luzes da cidade que batem nos pisos das calçadas e geram uma imagem diferente a cada passo. Caminhamos escrevendo uma história nova, vendo imagens novas e a luz, ah, a luz é nova a cada dez passos. Quem diria que algum dia seria assim, que estaríamos aqui, sozinhos, caminhando sobre luzes sem saber ao certo onde iremos chegar? São tantas imagens que fica difícil escolher uma porque, a cada passo, surge uma nova imagem e essa parece ainda melhor do que a anterior. E assim os passos se sucedem e as escolhas mudam a cada passo. E as que ficaram para trás? Quem se importa com elas agora? Não será a mesma coisa se voltarmos para revê-las. Como as lembranças que ficaram e foram boas. Não dá para querer revivê-las, elas tiveram seu tempo certo. Assim acontece com as más lembranças. Não precisamos dela, não precisamos de nada delas porque, se quisermos, cada passo dado gerará uma imagem pior, no caso, uma lembrança pior. Depende do ponto de vista. Agora estou aqui com você e, pelo resto dos meus passos, quero que você esteja comigo para ver todas as imagens que as luzes colocam à nossa frente. Que esteja comigo para me ajudar a caminhar e para fazer parte não apenas das minhas lembranças como também das novas histórias que serão escritas na minha vida.

Ela pareceu perplexa. Ele nada mais disse.

- Nunca imaginei que você conseguisse dizer tudo isso.

- Inspiração.

- Eu?

- É.

O silêncio da noite veio.

- O insensato da espera me cansa, queria que tudo pudesse ser sem qualquer condicional.

Ela o olhou sem saber se havia entendido.

- Sabe, daqui a algum tempo tudo talvez pareça tão simples, os condicionais do mundo e das outras pessoas talvez sejam bons.

- Para quem?

- Talvez para você, talvez para nós dois. Eu não sei.

- Então?

- O problema não é saber o que vai acontecer.

- Qual é o problema?

- Pensar que esses condicionais, em algum tempo, impeçam você de estar comigo.

Ela não sabia o que responder.

- Eu...

- Não precisa dizer nada. Estou feliz por estar aqui comigo. O futuro preocupa mas... sabe, o futuro sempre preocupou, então...

- Então?

- É isso, nada.

- Pelo menos sempre teremos as lembranças né.

Ele sorriu.