terça-feira, 16 de agosto de 2011

Histórias de uma vida não vivida (38)


*Quando opta-se por escrever sem inspiração acaba-se correndo o risco de transformar uma ideia em banalidade. Um propósito em perda de tempo. Uma vontade em fracasso. A opção é de risco porque, ainda que anos-luz de distância do ponto inicial da principal inspiração, tende-se a imaginar sem nada concreto para transformar algum pouco de ar invisível em um vento, ainda invisível mas, perceptível. Como tudo o que não se vê, dificilmente é definido, e quando, passado o estágio de sensação, torna-se sentimento, não há nada mais a fazer a não ser deixá-lo como fonte de inspiração, de criação e de todo e qualquer sorriso bobo diário. Nada disso, ou daquilo, me pertence, a vida deixa mais claro a cada dia. Entretanto há uma benção, que me é dada todos os dias e que me leva a acreditar que, mesmo não tendo comigo quase tudo, posso sentir felicidade.

Abrir os olhos parecia impossível. Era muita luz em cada milésimo de segundo transcorrido. Minha cabeça voltava-se ao chão sempre que meus olhos insistiam em mostrar que não conseguiriam ficar abertos naquele momento, com toda aquela luz forte que brilhava sem pensar no amanhã.

Porém alguma coisa fazia com que minha cabeça voltasse a ficar em sua posição normal, olhando para frente em busca de uma simples possibilidade de ver o que estava acontecendo. Nada mudava, a luz parecia cada vez mais forte e, com a provável ajuda de todos os elementos da face da Terra, tomava um espaço que não poderia ser calculado, tampouco imaginado.
Enquanto minha mente e meus olhos lutavam para ver quem decidia para onde minha cabeça ficaria voltada, se para o chão ou para frente, tentei entender porque ainda estava ali, permitindo que uma briga intensa entre o óbvio desejo de recuar e voltar às sombras era  combatido pela insana vontade de receber cada vez mais daquela luz, embora isso levasse a uma dor pontual em cada olho.

Os segundos tornaram-se minutos e por muitos deles fiquei ali, ora tentando olhar para frente ora olhando para o chão, tentando amenizar a dor que a luz forte forçava aos olhos. Sem qualquer lágrima derramada, sem qualquer arrependimento por alguns instantes de dor e alguma fraqueza. Incrível como um ser humano pode ser teimoso quando quer descobrir alguma coisa.

Por que eu ainda estava ali? O ambiente frio e sombrio longe daquela luz, que agora também era calor, parecia implorar-me, como o mal implora pela volta do pecador que busca conversão. 

Alguns minutos mais e nenhuma dor era mais sentida. Meus olhos agora olhavam para frente sem receio e podiam ver que um céu azul com nuvens brancas e um ponto amarelo irradiante eram a razão daquela persistência em não voltar à escuridão.

Dói, é difícil e a vontade de voltar ao comodismo da escuridão, da exclusão e de alguma outra forma de sombra,  pesam bastante e muitos desistem logo em seguida.

No final, vale à pena qualquer esforço, por teimosia ou com alguma dificuldade, quando há um dia bonito lá fora, mesmo que o Sol nem sempre brilhe.

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