sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Histórias de uma vida não vivida (40)


*Caminhei, mais uma vez, cheio da alegria típica daqueles que esperam, que imaginam, que flutuam em pensamentos cheios de amor. A cada passo dado um novo detalhe era desvendado, nos pensamentos, levando cada vez para mais longe de mim - e mais perto do céu - tudo aquilo que vejo de bom na minha existência. Sonhos não são tristes, não são sequer muito reais ou próximos do tempo vivido, o presente. Da simplicidade natural das coisas à magnitude complexa de relacionamentos ou grandes conquistas, tem-se no sonho a grande prévia e, com alguma consciência, uma certeza de querer ou não aquilo. Não esperava que fosse assim entretanto, passo pós passo, a imaginação se tornou sonho e... eu quis. O erro não foi esse, querer. Muito menos foi caminhar com alegria. O erro foi imaginar.

Pedaços de um pensamento (32)


Não gosto de retrospectivas, de listas com lembranças ou planos, acho isso uma hipocrisia pois tudo é deixado para agora, final de ano, preferencialmente nos últimos dias. "Ano novo, vida nova" é, para mim, uma bobagem sem igual. Por que esperar um ano terminar e outro começar para então querer fazer algo novo, realizar sonhos e, por que não, mudar algo em si? A resposta é simples e, além de explicação, é consequência para esse comodismo. É cômodo escolher um dia, um período do ano - que, nesse caso, é sempre o mesmo - porque se faltar vontade para realizar coisas novas, ou mesmo para ver que, independentemente do que tenha acontecido, foi um bom ano, há a desculpa de que 'no ano que vem...', e por aí fica-se, circulando sem sair do lugar, dando desculpas para céus e terra sem a mínima vontade de, efetivamente, fazer coisa alguma.

Por si, pelos entes queridos, pelo mundo. Mas principalmente por si.

Chega de ficar agindo burocraticamente, enrolando e fazendo de conta que 'nesse ano sim, agora vai', saia do marasmo e comece, primeiramente, mudando essa mentalidade covarde e preguiçosa. Ninguém espera que você acabe com a fome no mundo porém aposto que algumas pessoas querem que você esteja mais presente na vida delas. Por elas e por você. Não há sentido em tanta ladainha para fazer coisas simples como permitir-se viver coisas novas. As oportunidades aparecerão todos os dias, você só precisa de um pouco de fé e um pingo de vontade, de desejo, de sede de crescimento, de mudança, de vida.

Sim, sede de viver.

Enquanto o marasmo imperar, enquanto for mais importante preocupar-se com listas, com organizações e com 'não comer galinha que cisca para trás mas sim porco ou peixe, que comem para frente' ou - a melhor na minha opinião - 'vestir branco para paz e vermelho para amor', não haverá novos anos suficientes para que um dia tudo se resolva. Acredite, nada cai do céu por si só, você precisa dar uma força para que aquilo que o Todo Poderoso lhe envia não seja desperdiçado e se torne apenas vida não vivida, oportunidade não aproveitada, crescimento não usufruído.

Assim como não listo, não faço promessas e, como já devo ter dito, não gosto de retrospectivas. Um ano de muita tristeza e, sem ironias, de muita felicidade, só isso. Que Deus continue tendo paciência para com as minhas limitações e não desista de me dar, a cada dia, uma nova chance de vida.

Mais um ano, mais uma oportunidade porém... por que esperar pelo ano que virá?

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Ecos da sinceridade - Com o desabafo


Enquanto ouço um desabafo espontâneo e um tanto contraditório - na medida em que não fica claro o sentimento atual para com tudo o que passou - viajo bem longe, em pensamento, para uma vida que nunca existiu, de verdade. Cada palavra parecia alterar de uma forma bem conhecida parte de uma vida que nunca foi minha, de uma história que nunca escrevi e que, exceto reviravolta absurda e imprevisível na existência humana, nunca poderá ser contada como verdadeira.

Deixando de lado, ao menos por um parágrafo, o que passou pela minha cabeça, fui percebendo uma grande mudança na origem desse desabafo, daquelas palavras convictas, seguras, que retrataram tão bem fatos vistos pelos mais diversos olhos. A lembrança de tempos distantes, de ausência, de certo abandono é compensada cada vez que o erro é reconhecido, e volta a existir toda vez que a contradição no discurso faz com que o arrependimento pareça, no mínimo, irônico - tendo em vista todos os fatores negativos que foram fatos, e não imaginação.

"... ou pelo amor ou pela dor..." disse bem e, chegando aos dias atuais, a dor parece ser a consequência de alguns erros de escolha. A impaciência para com a demorada superação do momento de, ainda, alimentação de tristeza é compreensível porém inaceitável quando há claras lembranças de tempos passados em que erros, semelhantes, foram cometidos por medo da solidão.

Chegando à solidão voltei aos meus pensamentos. Tantas vezes ouço, e leio, vagando por aí coisas como 'não dê valor a quem não dá valor a você' e, sinceramente, acho uma bobagem sem tamanho. A solidão torna essa pequena demonstração de orgulho uma grande bobagem, porque a solidão age não só em pensamento, como no emocional e, em alguns casos, no físico. A desmotivação oriunda de uma ausência de convivência social - porém, principalmente, íntima, como amizades e relacionamentos afetivos - supera qualquer 'ele nunca vem falar comigo'. Claro, na maioria dos casos.

Tudo isso, solidão, desabafo e orgulho, em meus pensamentos, somados com a imaginação de toda uma história boba e impossível, trouxeram uma sensação de que falta muito para que haja constância e, por consequência lógica, superação do complexo que persegue meus dias há anos. Não há como simplesmente virar as costas e deixar tudo para trás porque há coisas enraizadas na razão.

Ao ver, e ouvir, alguém remoendo lembranças - ainda com alguma amargura, embora confiante no presente - traz, analogamente, tranquilidade por ser, em qualquer situação, aceitável uma demora - mesmo que excessiva - no começo de uma nova série de histórias escritas com vida, na vida. Enquanto o meu repouso é leve, a minha paz inexiste e a sede não me faz buscar água, continuo pensando - cada vez menos, é verdade - em tudo e tanto que existe e que está longe do meu controle, na minha mente.

Talvez só falte uma nova razão. Talvez.

quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Ecos da sinceridade - Com a antiguidade


Tudo aquilo que não é, no presente, e ainda assim é real, faz parte do passado. Imediato e despretensioso ou já concreto e assumido, não importa, aquilo que é página já lida, quando voltada para releitura e possível entendimento, mais atrapalha, tirando o ritmo natural da leitura. Não que esteja tentando, de alguma maneira, dizer que é, foi e pronto, só isso. Enquanto caminhei com uma verdade visível a quaisquer olhos humanos, o fiz sinceramente, acreditando ser aquilo tão somente por ser, não somente, aquilo tudo.

Enquanto o que vem de fora, de pontos próximos dos mesmos olhos que tanto viram - aquela que chamarei de minha - a minha verdade, cada vez mais carrega o pretensioso status de 'eu estava certo o tempo inteiro, só você não quis ver', o que vem do mesmo lugar de onde saía a minha verdade agora junta-se a tal pretensão, só que de uma outra forma: imaginação.

Não imaginação condicionada à possibilidade ou estritamente pela falta da mesma. Imaginação, nesse caso, desenvolve o que aparenta para um ponto de vista realista - não julgando quantidade de verdade presente no mesmo - que induz pensamentos, infelizmente, tristes.

Poderia ser um 'nada disso estaria acontecendo se', que também traria alguma decepção, porém menos intensa e infundada. Entretanto - e aí vem a antiguidade da coisa - o que é demonstrado leva do simples e trivial para o, nada menos do que terrível, "você nunca conseguiria". É irônico constar que não é a derrubada de uma quase inexistente autoestima o que é tão terrível naquela negação atemporal.

O que coloca em um patamar tão negativo a frase é a maneira como está sendo - insisto que implicitamente - exposta. Deixando de lado a parte paranoica que, garanto, não influencia essa visão, e focando apenas na intenção, possível, por trás de tais demonstrações, bom, não há como ter certeza de coisa alguma. A aparência é essa, a sensação é de haver essa intenção, boba, de querer demonstrar que o ontem não pode ser comparado com o ontem - mesmo que nunca tenha sido dito que o ontem tenha sido um padrão e obrigatoriamente devesse ser comparado com tudo o que fosse surgindo - e que é incrível também, e o que vem agora acentua ainda mais as impressões negativas, por ser tudo aquilo que, no fundo, sempre se quis.

Que a impressão de mentira no que pareceu um dia ser via de mão dupla, desapareça. Pelo bem do que foi, de um jeito jamais comparável, único. Mesmo que apenas um par de olhos admita essa verdade. E mesmo que tudo seja, hoje, tão somente uma antiguidade.

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Histórias de Bergamota (17)


Sem saber ao certo o porque, parei. E toda a dor veio à tona. O que antes pareciam leves arranhões agora eram, de fato, espinhos que perfuravam meu corpo. Poucas vezes senti tanta dor, tanta vontade de gritar, implorar por socorro. Tentava continuar, mas parecia em vão. Ir em frente, seguir o caminho que estava percorrendo, a missão a que tinha colocado-me à disposição. A dor aumentava a cada movimento, a cada indício de que continuaria independentemente da dor. Quanto mais doía, porém, maior era a vontade de alcançar meu objetivo, de desfrutar da vitória, da grande vitória após um longo e imenso sofrimento. O que vinha de fora machucava de um jeito único, imenso, porém não conseguia ser maior do que o desejo de satisfação, de dever cumprido. Era o meu objetivo, mesmo que cada vez mais sentisse dor. E como a dor aumentava a cada movimentação do meu tecido muscular.

Mesmo com tudo, e todos, querendo me derrubar e me tirar dali para evitar que sofresse ainda mais, não podia desistir. Não agora que faltava tão pouco. Para eles tudo seria em vão e, mesmo que conseguisse, não valia todo o esforço, toda a dor. Mais importante do que receber ajuda, do que perceber que outras pessoas se preocupam com o meu bem estar, seria saber que me apoiam independentemente do que estou tentando fazer. Pensando bem, não é muito racional nada do que está acontecendo. Talvez tenham razão mas...

Consegui. Optei e, a minha determinação, me fez conseguir. Cheguei ao topo. Estiquei o braço e peguei a bergamota mais alta do pé, a que mais recebe os raios de Sol e, por isso, a mais doce. Descasquei ali mesmo, em meio aos espinhos, em meio à dor. O sabor da vitória era doce.
E a bergamota também.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Histórias do Billi J. - Eu sou você amanhã (3)


(...)
Ficaram um tanto perplexos quando viram Rafael saindo do círculo que formavam em um canto do ambiente e indo até Andressa.

- Ele vai tomar um fora daqueles.

- E você é o culpado, Billi!

- Por que?

- Porque você encorajou-o a ir lá. Do jeito que ela é, orgulhosa que nem ele, vai estraçalhar ele de uma vez.

- Mas eu não mandei, só sugeri.

- Para quem arrebenta a cara, dá no mesmo.

- E se ela disser que sim, que o perdoa e que vão voltar?

- Acho difícil, ele sequer vai pedir perdão.

- Ãhn?

- Ele não vai falar nada, vai apenas olhar e gaguejar.

- Como o Billi fez, e faz, tantas vezes, na minha frente.

Riram.

- Como todo homem apaixonado faz quando realmente tem sentimentos por alguma mulher.

- Os homens são uns idiotas mesmo, as mulheres não valorizam o que fazemos por elas, o tempo que deixamos de passar com os amigos para estar com elas, os momentos que deveríamos ter com nós mesmos e passamos a ter ao lado delas, o trabalho que deixamos de lado para ficar ao lado delas enquanto tem cólica ou dor de barriga, sabe, é injusto mas os homens são idiotas por saberem de tudo isso e ainda assim sempre se colocarem a disposição das mulheres, mesmo que vejam que não são valorizados e que elas só nos querem por perto quando precisam.

Renata, Luiz e Billi olharam perplexos para Douglas. Renata até tentou pronunciar alguma coisa mas...

- É verdade, nesse ponto as mulheres são muito interesseiras.

- E no fim - continuou Douglas - te dão um pontapé na bunda e ficam com o primeiro vagabundo que oferece a elas uma volta em um carro importado.

- Eu não sou assim!

- Bom para você, Billi, que encontrou alguém que não quer se aproveitar do teu bom coração, da tua boa vontade, de todas as boas coisas que você aprendeu, também conosco, e que usa sempre. Porque, no fim, não nos levam a sério porque não somos como a maioria, não fazemos as coisas por fazer e, como o Billi diz, não vivemos por beber...

- Embora façamos isso com alguma frequência.

Riram.

- Enfim, não nos achamos os melhores, os mais bonitos...

- Porque não somos mesmo.

Riram.

- É, vocês entenderam.

- Não preciso nem perguntar se você ainda guarda mágoas dela.

- Nem sei, quero que vá para o inferno agora.

- Mas a história do carro é verdade?

- Claro que é.

- Mas você tem um carro.

- Mas não é uma caminhonete importada que custa uns trezentos mil.

Riram, contidos e um tanto decepcionados, mas riram.

- Voltando ao nosso assunto principal, olhem, ele continua parado na frente dela. É, Billi, você estava certo, ele não vai conseguir falar nada.

- Se ele não disser para a amiga dela que eu... ah, tanto faz, quero mais é chegar em casa e arrebentar minha cabeça na parede para ver se  esqueço daquela...

- Sim, daquela.

- É, com a Renata por perto fica chato falar palavrão.

Riram.

Enquanto isso, Rafael voltava de mãos dadas com Andressa. Ninguém perguntou coisa alguma, ninguém ameaçou indagar uma palavra sobre. Era como se não tivessem terminado o namoro há meses, como se nada tivesse acontecido. Amigos, reunidos, novamente. Ponto.

- Aaaaaaaaaah não, agora nós temos que sair daqui e fazer uns agitos.

Era Dancing Queen, Abba.

- Agora começou a festa.

Riram quando Douglas tirou os sapatos e as meias e começou a dançar, completamente fora do ritmo da música.

- Se vocês não começarem a dançar essa, vocês são uns...

Nem precisou terminar, todos riram. E começaram a dançar.

Rafael, discretamente, chegou perto de Billi e sussurrou:

- Obrigado.

Nada mais precisava ser dito. Aquele sorriso bobo, espontâneo, presente no rosto de cada ser movido pelo que beira o indescritível, tornava desnecessária cada palavra que pudesse ser dita.

- Billi!

- O que?

- Você dirige hoje, eu vou tomar mais umas geladas e me arrebentar dançando aqui.

Riram. Riram a noite inteira.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Histórias do Billi J. - Eu sou você amanhã (2)


(continuando)
- Então é isso, depois de uma rápida passagem no restaurante e quinze visitas ao bufete, estamos aqui, em um maldito baile de formatura de...

- Não me pergunte, não fui eu quem conseguiu os ingressos.

- Nem eu, queria mais era ver a novela das nove chupando uma bergamota.

E riram.

- É formatura de... deixa eu ver os ingressos... ah, sim, terceiro...

- ...semestre de que?

- Não, terceiro ano do ensino médio.

- Você me tira de casa para vir a uma formatura de crianças?!

- Concordo, isso não foi legal, onde fica a minha depressão medonha?

Riram.

- Foi mal, nem eu sabia que era uma formatura de...

(todos olharam para uma guria que passou vestindo uma saia mais curta do que dedo dobrado)

- Você, por acaso, ia dizer crianças?

- Veja bem, tenho que concordar com o Rafael, são crianças.

- Mas veja o tamanho daquele par de pernas expostas aos olhos de reles homens solteiros como nós.

- Rafa, mas só você e o Douglas estão solteiros, não se esqueça.

- É, só eu e o Douglas...

- Fala por ti, animal.

Riram.

Ãhn... pensaram, olharam um para o outro e depois apenas para Rafael.

- E jeito de dizer.

Riram.

- Então vamos.

- Espera, a minha namorada está vindo.

- De onde?

- Do carro, quis retocar a maquiagem.

- Como se precisasse, com um corpo daqueles, não precisa se enfeitar para te...

- Para me o que?

- Agradar.

Riram.

Depois de algumas horas, estavam os quatro, mais Renata, sentados em volta de uma mesa, escorados e...

- Que desânimo do caramba é esse, viemos aqui para nos divertir, certo?

- Eu vim para afogar as mágoas.

- E eu para me manter em uma terrível e profunda depressão pós pé-na-bunda.

- E eu porque não queria ficar em casa sozinho enquanto meus amigos ou enchem a cara de cerveja ou aproveitam uma festa infantil com a namorada, enquanto eu tenho que esperar a minha achar uma tomada para recarregar o telefone no fim do mundo para onde os pais dela levaram-na.

- Não prestei atenção depois que você disse cerveja.

- Mais uma, garçon!

- Não é bebendo que vocês vão curar essa tristeza.

- Tem razão, vou amarrar uma corda no pescoço e me atirar do alto da torre de celular.

- E eu vou junto garantir que a corda será amarrada também na torre.

Riram.

- Vocês sabem do que eu digo. E veja bem, um chora porque teve o relacionamento terminado e o outro porque terminou, quem sabe um não junta com o outro e...

- Termina essa frase e você nunca mais começará outra!

Riram.

- Tá, Billi, fala de uma vez, qual é o conselho milagroso dessa vez?

- Fica fazendo pouco caso e esse será o último copo de cerveja que você vai beber na vida.

- Vai me bater?

- Não, eu sou formado em Engenharia Química, lembra? Então, posso desenvolver algo para te tornar alérgico à cerveja.

- Depois da engenharia não prestei atenção em mais nada.

Riram.

- O que estava dizendo é que terminar uma relação é muito bom...

- Por que é muito bom, ein Billi? - Renata o olhava, curiosa.

- Para mim não seria, amor, mas para eles foi bom. Um reclamava do ciúmes e o outro da... do... de...

- Tudo! - gritaram, ao mesmo tempo.

Riram.

- Então, é uma boa hora de recomeçar. Vamos nos levantar, dançar, rir, cantar, nos divertir como sempre fizemos, com ou sem namoradas. Vocês são os caras mais autênticos que conheço, não é um... enfim, que vai fazer vocês deixarem de ser quem são!

- Você tem razão. Levantem daí seus dois deprimidos, vamos nos divertir!

- Para você é fácil dizer, em duas semanas vai ter 'o amorzinho' de volta.

- Mas hoje estou solteiro, como vocês.

- Então vamos conversar com aquelas três moças 'decentes' que estão olhando para cá.

- Eu disse que estou solteiro, não disponível e com vontade de pegar uma doença salivamente transmissível.

- Não ouvi mais nada depois do...

- Disponível?

- Não.

- Doença?

- Não.

- Então?

- Transmissível.

- Mas foi a última palavra que eu disse.

- Ah ta.

Riram, muito.

- Eles tem razão, Rafa, não é uma mulher que vai nos derrubar e nos fazer perder a oportunidade de diversão entre amigos. Porque os amigos são a prioridade na mi...

Douglas não terminou a frase ao ficar boquiaberto em ver...

- É a Andressa?

- Namorei com ela por três anos, conheço aquele jeito de mexer o cabelo. Só ela...

- Ai ai, perdemos nosso amigo.

- É, das duas uma, ou ele vai até lá ou termina a noite dizendo 'eu te amo' para o garçon.

- Pelo menos ele é um bom garçon.

Riram.

- Eu vou embora.

- Por que?

- Não suportaria a ideia de vê-la com outro cara.

- São dois  meses.

- E eu daria um braço... bom, uma perna... bom, uns cinquenta reais para voltar no tempo e não terminar o namoro.

- E o ciúmes, e a possessão, e a histeria e a falta de confiança?

- Quem se importa?

- Isso, gostei de ver, vai lá e fala com ela! - Renata empolgou-se.

- Claro que não!

- Por?

- Eu vou chegar lá e dizer o que? Andressa, sinto muito por ter terminado nosso namoro e ter te chamado de paranoica, birrenta, teimosa, ciumenta, possessiva...

- Chamou ela de tudo isso?

- Eu não acabei.

Riram.

- Arrogante, egoísta, ciumenta...

- Você já disse ciumenta.

- É que eu chamei ela de ciumenta umas seis vezes.

- Bom, não importa, se você ama ela, vai lá!

- Dizer o que, 'ó senhor da verdade'?

Riram.

- Diz que o Douglas quer conhecer a amiga dela e que só veio fazer esse meio de campo entre os dois.

- Mas tu é piá pançudo mesmo, tá louco.

- Gênio. Esse cara é genial. Não é atoa que ele...

Renata esperava o adjetivo ansiosamente.

- Que ele sempre dá bons conselhos.

Billi suspirou, aliviado.

Riram.

- Só isso, depois faço o que?

- Olha nos olhos dela, segura uma das mãos e pede perdão.

- Só não vai listar todos os adjetivos que você disse para ela.

- Parei em 'adjetivos'.

Riram.

- Olhando nos olhos e pedindo perdão, com aquela cara de coitado que só você sabe fazer, ou ela te perdoa com um beijo ou diz que não tem mais chance.

- Se ela disser que não tem mais chance, diz que o lance da amiga dela comigo ainda tá valendo.

- E depois você se joga do viaduto.

Riram, cada vez mais.

(continua)

Histórias do Billi J. - Apenas um email


"E aí, amigo, como estão as coisas?

Bom, não tenho muito tempo, então serei o mais breve possível. Eu sei, tão bem quanto você, o que é ouvir algo que desperta sentimentos passados de... enfim, esse tipo de sentimento que tanto tentamos controlar quando queremos ser coerentes com um propósito de vida diferente. Optar por não mandar a pessoa para a p... para o raio que o parta, é uma decisão sábia, moldada na busca pela tolerância, que evita que sejamos preconceituosos e tudo mais mas... é difícil.

Entendo que a pessoa seja, tão somente, uma cabeça-oca. Não sei se o termo está bem escrito assim, com hífen, mas não importa. Ela ter vindo dizer algo que te trouxe um grande desânimo é, sem dúvida alguma, uma provação pela qual você, ao menos à princípio, passou. Cuide ainda mais nesses próximos dias, uma vez que quando se supera uma provação, atacam direto nos nossos pontos fracos. Quanto a ela, bom, ignore, desfaça-se desses pensamentos e o fato de ter de aguentar uma gozação 'engraçadinha' de alguém que, de fato, não está se importando com o que você pensa ou mesmo tem conhecimento do porque você tem dificuldades em levar essas coisas adiante. Também, e isso é fundamental, não tente justificar, explicar, dar razões para ela entender os teus motivos, as tuas razões - que são a verdade dessa situação - porque... afinal, a vida é de quem?

Sei que entendeu. Ah, antes que eu me esqueça. Ainda nessas provações entendo que ter evitado fazer alguns comentários, hoje, foi uma boa escolha. Se os outros quiserem, que digam, você acabará ouvindo mas não estará alimentando uma corrente que só tem um fim quando alguém decide calar-se. Boa escolha e, mais cuidado ainda - vide o alerta anterior.

De resto, é complicado sim ter a certeza de uma avaliação condizente com o esforço e com a dedicação, ainda mais quando há tantos poréns nesse contexto todo. Enquanto tiver chance, supere um pouco mais o limite da sua própria atenção e aceite que você não consegue assimilar e prestar atenção com a mesma intensidade que outras pessoas. Sei bem como é isso pois, se tivesse prestado mais atenção, a Renata e eu... bom, você sabe a história até melhor do que eu, tantas vezes foram as que escrevi sobre ela. A história e, também, a Renata.

E sobre a... como é mesmo o nome dela? Ah, que burro, você não disse o nome. Bom, deixa para lá.

Abraço, amigo.

B.Johansson"

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Pedaços de um pensamento (31)


Quanto maior parece ser a vontade, mais lentamente o tempo parece passar. Horas que, com olhares aleatórios no mesmo lugar, fazem a noção de contagem de tempo se perder completamente pela ânsia de saber se, enfim ou não, todo e qualquer dizer é uma grande quantidade de incômodo, simples e diversificado incômodo. Não posso me colocar no lugar e imaginar que a resposta, para qualquer pergunta que possa sair do meu lado, é sim ou não como também não posso imaginar quaisquer coisas que independentes do meu pensamento. Assim como o céu, azul claro e sem nuvens, me traz a sensação de que estou desperdiçando vida aqui, o simples - e não menos irônico - fracasso em não conseguir qualquer conclusão dá a impressão de desperdício de pensamento.

Um tempo que não tenho para respostas que não sei de perguntas que não tenho coragem, e talvez nem oportunidade, de fazer. Quanto mais preciso me preocupar com o que vem pela razão, mais pareço me preocupar com  que foge dela. Irracional é tudo aquilo que não segue uma lógica, um sentido racional - e existencial - de ser.

Isso não quer dizer que perdi a razão. Apenas perdi a vontade de tentar encaixá-la em um grande espaço que, hoje, uma coisa chamada saudade - inexplicável e um pouquinho irônica - ocupa. O que não se perdeu, mesmo, foi o senso de 'não quero que nada meu atrapalhe o seu'. Talvez seja tempo de replanejar isso, também.

De qualquer forma, é sim, saudade, mesmo que não faça muito sentido. E, para não deixar de colocar uma verdadeira e grande ironia, mesmo que não faça sentido e seja um tanto irracional, há motivos (também) racionais para a saudade.

Para essa saudade.

*Até domingo, ou segunda, quando, 
provavelmente, 
colocarei palavras nada minhas aqui.
Porém, também nada irracionais.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

O vazio de viver e só (24)

Em teoria, o que recebo é muito pouco. São eventuais, quase raras, as palavras trocadas. Poucos também são os momentos, praticamente pontuais em uma linha cronológica. Sequer recebo palavras específicas que poderiam mostrar-me alguma reciprocidade mas... mesmo que a teoria - sempre arrogante, assumindo-se (falsa) dona da verdade - diga que é pouco, quase nada, não consigo considerar pouco, quase nada, cada pequena frase, muitas vezes monossilábica. Mais uma vez teoricamente, a sensação - que vai e vem como ioiô - de abandono, aguçada por tudo o que tem me derrubado sem piedade, bem, essa sensação acaba sendo sim uma explicação para que pequenas palavras tenham grande efeito.

A teoria é mentirosa - como nesse caso - porque não é sensível às pequenas variáveis que interferem, e muito, em um resultado, gerando conclusões e, sem dúvida, preceitos nada concretos. Definir quantidade é sempre perigoso - quase sempre um erro de contagem e percepção - e então, mais uma vez, a teoria erra por não saber aceitar que uma mesma quantidade tem significados diferentes.

Infelizmente acho que não é o suficiente mas, não consigo mais esperar pelo que vem de vidas alheias - ou de uma vida alheia, como agora. Tanto faz se, no final das contas, qualquer possibilidade seja, como é costume na minha história, apenas um surto de esperança, e nada mais. Menos diferença ainda pode fazer o fato de não saber o que acontece, o que pode estar acontecendo, aquela dúvida sempre permanece.

Por tantas vezes achei que não aguentaria mais, inclusive agora, por diversos motivos. E onde estou? No chão, caído, entregue à tudo que me derruba?

Não.

A Graça Divina me possibilita sempre recomeçar. E crescer, aprendendo que, nesse caso, qualquer minúscula palavra é sim, motivo para um sorriso espontâneo.

domingo, 27 de novembro de 2011

Pedaços de um pensamento (30)

Buscar uma definição de inerte traz, inevitavelmente, diversos condicionais. Inerte é uma variável conforme o que você tem como contexto para ele porém, vem do ar a sua definição que melhor consigo encaixar em mim. Inerte, em questão de gases e, por consequência, do ar, é aquilo que não reage em condições normais. Reação como mistura, deixar-se envolver e envolver-se com o que está ao redor. Inerte estou por não conseguir me sensibilizar a um certo caos que está criado há meses na parte mais exigente da minha vida. Nada do que tenho tentado fazer tem efeito e minha mente é inerte a quase tudo que a envolve, muito ou pouco, nesses dias.

Tantos dias.

Andar junto com sucessivas ausências - e evitáveis erros - tem acentuado essa diferença entre o que não consegue provocar mudanças. Escrevo com receio de ser mal interpretado, não por possíveis ofensas e sim por preocupações demasiadas para algo que foge de responsabilidade distante daquilo que não se assimila. Entendo que estando muitas vezes no lugar errado, mesmo que sem qualquer intenção negativa, consigo encontrar os piores desfechos.

Felizmente ninguém além do meu próprio domínio é afetado com esse inerte que por vezes me domina. Cansei do morno, do simples continuar, tempo que passa e afins conformistas. Há tempos assim, recaí por influências externas daquilo que sempre foi menor preocupação. Perdi parte do meu calor e talvez essa seja a única contradição no estado em que não há reação com o que envolve.

Que o vento leve tudo o que há, então, para que possa recomeçar do frio porque, 'sejais quente ou sejais frio, não sejais morno que eu te vomito'.

Inconformado. Em silêncio.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Ecos da sinceridade - Com a tristeza


Inconstante.

Difícil encontrar palavra que defina melhor os últimos dias. Dias de euforia, dias de decepção, dias de redenção, dias de lamentação, dias de sabe-se-lá mais o que e, enfim, dias de confusão. Tristeza, como o título evidencia. Jamais achei que seria eterna a alegria exponencial que havia derrubado inseguranças sobre um futuro, aparentemente, não muito promissor. Os pés no chão - chamados também de realismo - amorteceram um tanto uma queda provocada por...

... lembranças.

Recomeçar e deixar que Façam-se novas todas as coisas não evita - infelizmente - que fragmentos do passado derrubem a já quase caída euforia de momentos únicos. O problema está nessa unicidade clara de ambos os momentos, os poucos que geram euforia no presente e os lembrados que, sem dúvida, geraram euforia no passado. A distância do Sublime, por tantos pequenos motivos, ajuda nesse desentendimento com a própria mente.

Eu disse para ela, minha mente, que era passado, que o importante era a vivência do amor e da felicidade, que sonhos deveriam ser novos, sim, novas todas as coisas em toda a Terra. Por isso não me sinto culpado. Entendo, enquanto escrevo, que a minha falta de concentração, de atenção em palavras, sons e imagens, se estendeu até mesmo para meus pensamentos, minhas ordens para o meu consciente - e, ironicamente ou não, para o inconsciente também. Bem tentei e o fiz com vontade, pelas coisas novas e - sem ironias - pelas velhas, passadas, sim, pelas lembranças também.

A verdade que fica é aquela que a mente insiste em querer mudar. Não se muda uma verdade, ainda mais quando é espontânea e sincera, de uma hora para outra ou, nesse caso, de um pensamento para o outro. Berrei, e agora tento sufocar alguns outros berros, para que meus pensamentos fossem novos também, abrindo então possibilidades para novos pensamentos, para novas verdades.

Verdades. As que tenho não suprem a necessidade da mesma verdade que hoje, por ser tão somente lembrança, machuca. A tristeza é, evidentemente, amenizada pela certeza de que - bem ou mal - é melhor que sejam essas as verdades, uma vez que há felicidade nisso tudo.

Procuro a parte da felicidade que parece escondida por, nesse caso, meus pensamentos não poderem abafar uma tristeza apenas pela vontade, pela doação, pelas lembranças.

Estou, sem motivo aparente, feliz porém, essa história de sinceridade me impede de deixar passar que... estou parte triste, também.

*Verdade Absoluta, 
afasta de mim essa tristeza, 
preciso de Você.

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Ecos da sinceridade - Bem próximo do motivacional


Chega de dizer que não dá, que não tem como, que você é desse jeito e pronto. Chega de reclamar que Deus não te ajuda e que o mundo conspira contra. Chega, na mesma proporção, de gritar aos quatro ventos que quer mudança, prometendo que o fará imediata ou proximamente. Cansa ouvir tantas promessas, semelhantes, de pessoas diferentes.

Porque quase tudo fica só na promessa.

Antes de mais nada, se quiser mudar, escolha uma verdade, seja ela Verdadeira ou não, e acredite nela até o fim. Isso se chama convicção. Começar uma mudança tendo ao menos uma convicção absoluta é o primeiro passo para sair desse marasmo de vida, dessa rotina de pensamentos, atitudes e consequentes finais iguais.

Depois da convicção, porém, vem o primeiro problema: a coerência. De que adianta escolher uma verdade e viver como se não acreditasse nela, abrindo exceções sempre que conveniente? Nada. Não adianta querer ser alguém diferente e continuar agindo igual ou, em um exemplo bem mais pobre, vestir roupa de roqueiro e ouvir um sertanejo para dançar com aquela ruiva estonteante que você viu na festa... aliás, o que você estava fazendo em uma festa sertaneja sendo que quer ser roqueiro?

Coerência.

Depois da coerência vem... bom, geralmente aqui a mudança já é significativa, porque poucas pessoas conseguem ser bastante coerentes com suas convicções. Também não adianta ser coerente com convicções e não ser coerente com seus ideais. Sonhos, no caso. Aceite, faça sacrifícios para conseguir o que você quer, levando em conta que os sonhos, aqui, são bons sonhos, sonhados com verdade, impulsionados por amor.

São três, quatro coisas. É só isso e você já mudará de frio para calor, de mundo para céu, de utopia para realidade. Ninguém disse que vai ser fácil, mas garanto - mesmo que a minha opinião valha menos que um tostão velho - que vale à pena muda, radicalmente, para melhor, para a verdade.

Ou, no meu caso, para uma sinceridade inteligente.

quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Ecos da sinceridade - Para com você e minha mente


O desejo é fazer estalar em você a mesma vontade que há em mim. Não o faço porque ainda sou incapaz de atingir o meio termo entre o subjetivo indireto e a sinceridade absoluta, a forma mais clara de palavras diretas. Também continuo responsável apenas pela parte que é, por direito, minha, porque, como acabei de escrever, é a única parte a qual tenho direito sobre as ações e, consequentemente, sobre as palavras. Entendo ser fruto de paranoia - e antes que seja levada adiante, não a esclarecerei - o que insiste em colocar negações atemporais, geralmente absolutas, em uma possibilidade que, em suma, nunca foi cogitada com seriedade - exceto no meu maior domínio: a minha mente.

Dizer a alguém o que fazer, estando de alguma forma ligado a situação, é um erro que a grande maioria comete. Torna-se falsa a intenção das ações e das palavras porque, no fundo, sabe-se que é para a realização da própria vontade - mesmo que não seja uma questão de vida ou morte, ou de futuro conjunto, em si - e então, por consequência, chegamos ao egoísmo. Entender que o que se sente, ou a mera vontade de buscar conhecimento mútuo, é uma verdade em potencial não justifica, em hipótese alguma, agir em benefício próprio com a desculpa de estar auxiliando ao outro.

O exemplo mais claro que vem à mente, e que pode muito bem tornar claro o que muito provavelmente ainda não está, é o seguinte:

"Um rapaz vive sua vida estando apaixonado por uma moça. Eles se conhecem desde pequenos porém, em algum ponto, ela apaixona-se e casa com outro rapaz. Anos depois o rapaz ainda a ama, porém respeita a decisão da amada, embora não se conforme com o fato de conhecê-la por anos e "perdê-la" para alguém que a conhece a muito menos tempo. Algum dia o esposo da moça sofre um acidente e morre. O primeiro rapaz da história então se aproxima ainda mais da moça, agora viúva, buscando consolá-la de todas as formas."

Esquecendo a dramaticidade, que faz esse trecho parecer de um filme hollywoodiano, e focando no que interessa, até que ponto a intenção dele por trazer conforto a ela faz parte da solidariedade e da essência de amor ao próximo? Naturalmente, em algum momento, irá usar de algum artifício para tentar fazê-la esquecer de vez o falecido esposo e então, conclui-se, começar uma vida nova ao lado de outra pessoa. Ele quer ser essa outra pessoa, sempre quis, e por mais que seja verdadeiro o seu amor, não justifica usá-lo como desculpa para tentar afastá-la rapidamente da dor e do sofrimento pelo falecimento.

Há um limite entre a sinceridade do gesto e o benefício próprio. Desconsiderando também, agora, qualquer outra regra moral implícita em nossas mentes, é óbvio que o melhor para quem perde uma pessoa é, o quanto antes, deixar de viver em função da perda. Entretanto isso também não justifica a possível - e quase sempre subsequente - intenção de começar um novo envolvimento. Tudo parece pesar a favor, eles se conheceram sempre, ele a ama e está claro, ao menos hipoteticamente, de que quer vê-la feliz só que...

Podem me chamar de chato, implicante e tudo mais porém não vejo razão para mudar de opinião. Não justifica. Como nenhuma ajuda é justificável quando feita, em primeiro lugar, para um benefício qualquer próprio. É como se você fosse a algum lugar sabendo que irá receber uma recompensa. Você, sabendo que não receberia recompensa alguma, iria mesmo assim a esse lugar? Esquecendo dos condicionais favoráveis - e contrários - duvido que iria, a não ser que a intenção de ir ao lugar fosse espontânea, desinteressada e, principalmente, incondicional.

Há muito não demonstro insatisfação indireta com alguém e, há mais tempo ainda, não justifico qualquer atitude minha por vontades, desejos e sentimentos próprios. Nada do que parte de mim justifica ou exige que algo deva partir de outra pessoa em minha direção. Além do egoísmo pela busca de algo a receber há a arrogância de colocar-se como centro de algo, sem justificativas coerentes e verdadeiras.

A verdade, quando vinda apenas de um lado, nunca justifica a verdade que parte, da mesma maneira, de, no mínimo, dois lugares diferentes.

Com o tempo se aprende isso. Embora nem todos tenham humildade para admitir.

*tenho consciência que seria muito criticado 
se alguma pessoa lesse os meus textos 
e nada do que escrevi tem a intenção de 
provocar qualquer atitude, em quem quer que seja.

sábado, 29 de outubro de 2011

Histórias de bergamota (16)


Sempre me disseram que uma imagem vale por mil palavras. Que um gesto vale por mil palavras. Esses filósofos de banheiro do passado, que no presente são filósofos de twitter, não conseguem definir quantidades e equivalências de valores, intensidades e afins. Não os culpo, eles não sabem diferenciar o dia e noite, verdades e mentiras e, menos ainda, jacas e cajus. Por isso não dou ouvidos a frases feitas, mitos populares transformados em verdades absolutas para mortais que não conseguem compreender que um acerto depende de uma escolha que, muitas vezes, exige um sacrifício.

Vivendo no bem bom eles não precisam sofrer, não precisam transpor uma exigência que sacrifica algo em si que tanto prezam e, óbvio, não saem do lugar na dita escada do subvalorizado - porém jamais insignificante - crescimento pessoal.

A fuga dos momentos de raiva e a consequente atitude de reprimir impulsos que afetem negativamente a vida de outras pessoas é, sem dúvida, um dos pontos chave do tal crescimento pessoal.  Aceitar que a tolerância é fundamental não só para o convívio social em estado de paz como também - ironicamente com maior importância - para a dita, e hoje em dia tão banalizada, paz interior. Olhar para atitudes passadas em momentos pontuais que exigiam, subjetivamente, um controle maior da própria personalidade traz momentos de riso, decepção e, caso a explosão tenha sido controlada, satisfação pela superação, mesmo que com grande sacrifício, de uma limitação meramente humana.

Nenhum animal sai por aí batendo em outro sem um motivo. Nenhum é morto pelo outro apenas por prazer ou espancado por inveja. Animais seguem instintos - com o perdão da redundância - animais, o que basicamente não passa de um 'comer, reproduzir e fazer com que o fruto da reprodução tenha o que comer'. Seres humanos matam, espancam e fazem coisas piores, quase sempre motivados por algum tipo de distúrbio agressivo, apenas por... bem, os motivos são muitos.

A raiva, antigamente, era disseminada com bergamotadas. Ninguém morria, ninguém ficava gravemente ferido, ninguém era assaltado por causa de bergamotas e ninguém assaltava atirando bergamotas. A raiva era dissolvida a cada bergamota transformada em projétil. O crescimento pessoal não era banal, sendo que aqueles que o alcançavam não mais atiravam bergamotas uns nos outros. Ninguém postava no twitter frases como 'acabei de atirar uma bergamota na fuça* do meu vizinho' ou 'meus vizinhos idiotas vivem trocando bergamotadas'. Ninguém.

O mundo era, sim, um lugar melhor no tempo em que os xebas subiam nas bergamoteiras, quebravam seus ganhos e espalhavam bergamotas por todas as ruas.

A paz imperava.**

*em termos bagualísticos, fuça é rosto, face.
**Exceto se você passasse por um deles usando um boné muito caro.

(Sim, um texto idiota.)

Ecos da sinceridade - Com o Absoluto


Sentado na sacada, imploro que Deus faça ecoar na imensidão desse pôr do Sol algum solo musical de piano, como fundo para esse momento. A solidão absurda nesse metro quadrado de área ao ar livre entre tantos prédios me traz lamentações passadas - porém, de maneira alguma, insignificantes. Na mesma proporção em que busco, às lágrimas, sentir os raios de Sol que parecem atravessar meu corpo sem tocá-lo, tenho a impressão de que tudo foge do meu alcance em um simples piscar de olhos, ou em um pequeno desvio no caminho - ainda que não se tenha sido completado-o. Parece injusto - e a injustiça parece uma certeza quando um bando de pássaros cruza o céu sem destino aparente - porque tenho a impressão que somente eu sou cobrado por cada, pequeno ou grande, erro, desvio, limitação ou fraqueza. Entender o motivo dessa ideia não é fácil, sobretudo quando se leva em conta uma história aparentemente normal. A singularidade torna-se utopia e nada do que vem a ser dito é assimilado. Pior do que tentar entender é não querer compreender tudo o que envolve essas situações. Enquanto o tempo passa, o Sol se esconde e a luz artificial toma conta parcial da minha visão, sigo com incertezas, dúvidas quanto à existência e suas subsequências. Dizer para a própria Verdade que nenhuma verdade saída de mim teve qualquer importância entre um tempo é doloroso e isso torna-se pior quando ganha tons de reclamação. Irrito-me por nada acontecer, por momentos de insatisfação (nem tão lógicas) voltarem justamente quando o caminho convergia à Luz.

Tudo o que tenho vivido ganha tons estranhos, irônicos e até mesmo dramáticos e, por nada disso ter um fim aparente, o tom da cor, do som ou da intensidade desses momentos, sensações e sentimentos, acaba não sendo relativo, definitivo para uma conclusão. A Verdade está aí, é necessário apenas que se busque, com mais forças do que se tem, vivê-la.

Quem sabe assim, com a ajuda da sinceridade diária, a vivência absoluta da Verdade seja menos complexa, melhor percebida, e assim se possa ouvir um barulho vindo do Céu.

Barulho que poderá ser, muito bem, um solo de piano.

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Reflexões de um maluco (19)



A sensações, imagens de um passado sem dono e imaginações desviadas são mais do que suficientes para criar uma barreira quase intransponível que separa o ser humano de si próprio. O desvio de um foco - qualquer que seja ele - é o contra objetivo. Não há sequer uma razão emocional que justifique a não aceitação daquilo que é momento, de intensidade absurda e incontrolável - ou quase. Entre todo o pensar, a impressão de que a sensação, o momento e a vontade - quando desejada - acabam tornando-se uma verdade justificável por si só é plausível - e passa a ser aceitada por qualquer mente que não consegue aceitar que há muito mais tempo do que vida.

Assimilar, e nada sequer o mínimo distante disso, que as escolhas levam para um lugar muitas vezes sem volta, é admitir para si mesmo de que cada passo dado influencia muito mais do que no próprio momento de vivência iminente. Os grandes erros da história surgiram, possivelmente, em momentos em que o ego assumiu o controle, deixando à razão tudo aquilo que é habitual e jogando - com um grande teor de hipocrisia moralista - a culpa naquilo que é sentimento, que é emoção.

Justificar escolhas por desejos sentidos e, ironicamente, sinceros não convém àqueles que desejam muito mais do que o momento, a sensação, o agora. Quem puder reconhecer em seu passado momentos chave em que escolhas mal feitas foram, salvo raras exceções, ponto de partida para grandes e dolorosos sentimentos - mesmo que somente após muito tempo. A definição não serve apenas para apresentações ou conversas entre pessoas que possuem algum interesse, mútuo, em conhecer ao outro.

Saber, palavra por palavra, quem se é, o que se faz e aquilo que se tem por convicção e ideal torna-se justificativa verdadeira para escolhas que parecem erradas, para mentiras disfarçadas de verdades e sonhos fantasiados por desejo ou pela, não menos errada, escolha de momento.

Assim como sensações não justificam erros que vão contra a verdade própria da pessoa, sentimentos, por mais sinceros que possam ser, não justificam ações e opções que afastem a razão, ou a própria emoção, do corpo ou coloque entre as duas uma linha imaginária intransponível. Pelo que sinto, sensação ou sentimento, não posso justificar - e aqui alguém haverá de criticar e discordar - qualquer escolha que vá contra o que tenho como verdade, por mais sincero que seja.

Não sei dizer, agora, se existem meios erros porém, se existirem, algum alívio tomará conta de mim. De resto, a certeza de que continuo não fazendo parte de um mundinho o qual sempre critiquei - mundo que é maioria na sociedade e que não compreende que a verdade, em todos os seus valores, é a grande chave para a verdadeira felicidade.

A sinceridade, em mim, ganhou credibilidade pois lembrou-me, no momento crítico, quem sou. Nenhuma palavra saiu, nada mesmo foi dito. Para aqueles que pensam que sinceridade é apenas falar o que pensa, saber disso é um tanto confuso. Não importa.

Sei que fiz a escolha certa. O problema é, também, saber que, embora tenha acertado, também tenha errado.

domingo, 23 de outubro de 2011

Pedaços de um pensamento (29)


À espera de um definitivo, um milagre definitivo que transforme todo esse desdizer patético em linhas inteligentes, interessantes, fundamentadas em um projeto de presente e futuro. Esquecendo o passado, as minhas palavras não estão mais onde estavam, o meu sentimento não está mais onde estava, duvido que ainda reste alguma lembrança. Nada do que posso ter sido restou e é, somente, a minha existência a única prova de que tudo aquilo um dia existiu.

Não adianta, mesmo batendo com a cabeça e insistindo o passado não vai desaparecer. Do nada ao tudo, variável pela origem do ponto de visão, passasse pela unicidade literal de um tempo e duas vidas. A mesma água que jorra hoje ao chão, pelo olhar para trás, para ajudar a germinar um futuro indefinido algum dia correu apenas por constatações tolas de que o nunca era logo ali.

O nunca era e é logo ali. Lá.

Milagres só acontecem quando, além de fé, há vontade e verdade. Penso ter vontade porém sinto a verdade próxima, como parte de mim. Se tudo tivesse, na realidade, não haveria problemas e os milagres estariam jorrando, pois conclui-se por fé a entrega de todo o futuro.

Retificando palavras depois, há um quarto elemento para o milagre.

Um elemento temporal. Atemporal.

Depende de que lado do princípio do ponto de vista você está. Próximo de que número está o ponteiro do seu relógio.

sábado, 15 de outubro de 2011

Pedaços de um pensamento (28)


Aceitar que, mesmo que você mova um mundo nada muda para melhor, é entender que nem toda mudança traz um sorriso, nem todo crescimento faz de você alguém melhor e não há mundo que mude apenas pela sua vontade. Há casos e casos mas, geralmente, há um condicional maior que tudo isso, que interliga a minha vontade com o que acontece, com a minha história a ser escrita com qualquer coisa que possa a ser vida ao meu redor, à partir de uma escolha minha. Difícil entender, e ainda por cima ficar feliz, com uma situação boa que parece mais com um fracasso patético. As linhas tortuosas das nossas vidas nunca, e nesse caso não há exceção, correm sozinhas, não são apenas as nossas escolhas que definem quem seremos. Optar por um caminho longo ou curto, fácil ou difícil, verdadeiro ou tolamente superficial é, antes de qualquer definição, a abertura de um imenso leque de possibilidades.

E, no meio dessas possibilidades, aquela que mais se encaixar com você será, quando chegar a hora certa, mostrada a você. Não há nada escancarado, não há nada muito claro entretanto, e as exceções continuam inexistentes, quando você estiver preparado para a verdade que está por vir, quando souber lidar com todas as mentiras que lhe serão jogadas contra para tirar-lhe dessa verdade, você saberá que é essa, e não qualquer outra verdade.

Não que essas outras verdades não sejam verdades, mas elas não são a sua verdade. Elas não são A Verdade.

"...the sun will shine..."

sábado, 8 de outubro de 2011

Pedaços de um pensamento (27)


Superar uma fase com um sorriso no rosto não faz qualquer diferença perante o todo da vida, do mundo, nem mesmo da fase. O que  foi superado é, embora não seja de fácil descrição, motivo de orgulho pela conquista, pela superação em si ou pela ansiedade que surge em cada novidade, a vontade de começar a viver uma nova etapa, percorrer um novo caminho. A grande diferença entre dar início a um novo capítulo no livro da vida com um sorriso no rosto e sem é que, quando o sorriso é para si, demonstra que você sabe que tudo o que está acontecendo é a verdade que você precisa viver, que os momentos difíceis que ficaram para trás são também, agora, motivo de alegria, pois sem eles você não seria o que é hoje. Sorrir não muda o mundo, não muda a sua vida e não reduz os seus problemas.

Sorrir, nesse caso, mostra para o mundo, e confirma para si mesmo, que não há necessidade maior do que aquelas que já foram supridas pelas pessoas que estão com você e que ajudaram-lhe a percorrer tudo aquilo que hoje é passado.

Sou grato por tudo, e principalmente por todos, que Me destes de presente ao longo dessas vinte diferentes comemorações.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

O vazio de viver e só (23)


Há algum tempo caminhava sobre uma linha de limite. Se passasse por ela, imaginava, estaria descendo ainda mais em um buraco de desilusões, tristezas, desamparo, desânimo e angústia. O temor de ir além de onde já estava, o que já é(era) muito, fazia com que cada detalhe que indicava a possibilidade da existência de um absoluto fim da esperança atordoasse cada escolha feita, cada palavra dita, cada desejo sonhado como se fosse o último. Entre tudo o que aconteceu - e não aconteceu - e tudo o que deixou de acontecer - e ainda assim aconteceu - havia alguns pontos de interrogação. Supus ter várias respostas porém, ironicamente, duvidava delas com intensa desilusão.

Durante esse tempo, respondi por outras pessoas a pergunta: "Você vê a mesma verdade que eu?" e, dificultando ainda mais a minha permanência na - já terrível - caminhada na linha de limite, o que obtive foram decepções. Não encontrar muitos 'sim' para uma pergunta que não saiu de minha cabeça poderia ser, então, o ponto limite nessa caminhada.

Há frases de desconhecidos que fizeram do hoje o ponto limite. Superei a linha que havia delimitado como limite de sanidade, possibilidade de sorriso e reconhecimento da vida como uma maravilha. Deveria, pelas suposições passadas, estar deitado no sofá pressionando uma almofada contra meu rosto - ou alguma atitude semelhante, igualmente idiota, desesperada e sem finalidade compensatória - na lamentação extrema proveniente da constatação de que, entre todos, estaria eu na pior das colocações - independentemente de qual lista estaríamos fazendo.

Escrevi em primeira pessoa para concluir, depois de pouca clareza, alguma subjetividade e nenhuma descrição clara, que, bom, mesmo ultrapassando um limite sob o qual acreditava estar caminhando - com um medo infantil de dar um passo adiante - não sinto a (ignorante) necessidade de tomar alguma atitude contra a minha mente, o meu corpo ou mesmo a minha alma. Também não me conformo com o popular 'a vida continua' pois, embora seja verdade, é conformista demais.

Paro e lamento, sofro com uma tristeza monumental entretanto, ironicamente ou não, agora sinto-me muito próximo de uma linha exponencial pela qual, provavelmente, caminharei para novidades. Não sou um vencedor por ter superado um limite (negativo) e ainda estar tranquilo. Se ainda conseguisse, talvez estivesse olhando para fora perguntando, para Céu e mundo, "por quê?".

Tudo isso é tão... estranho que não consigo direcionar as palavras para algum lugar. Elas estão aqui, comigo, apesar de tudo o que deveria levar-me a destruí-las na minha simples forma humana. Guardadas incondicionalmente aos pensamentos, aos limites e às novidades.

Guardadas pela eternidade limitada da minha vida humana.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Histórias de uma vida não vivida (39)


*Quando fecho os olhos posso sonhar sem qualquer tendência. Os olhos são impedidos de ver e as mais diversas sensações podem ser percebidas para, aí sim, transmitir ao sonho um aspecto imaginável, entretanto real. Realidade que foge do meu controle quando a minha imaginação, e com ela os meus desejos mais escondidos - e sinceros - vem à tona. Fujo da imagem que está ao meu alcance e me concentro na que longe de mim está. Pouco disso posso alcançar, quase nada terei comigo. Não me importo com isso, agora. Pois antes mesmo que feche os olhos, já começo a lembrar, a imaginar e, sem qualquer limite, a sonhar.

Ao acordar, hoje, estranhei ter dormido descoberto. A roupa de cama estava lisa como se ninguém passasse por ali há dias. Melhor para mim, pensei, pois não teria de arrumar. Meu colega de apartamento havia deixado a porta aberta, idiota! Aproveitei e, sem me arrumar, saí correndo pois estava atrasado. Quem se importa com a minha aparência? Os outros são os outros já cantou alguma voz brasileira.

Sempre tive, por hábito, desviar sempre que alguém pudesse bater em mim. Alguns não pisam em riscos ou divisórias no chão ou sempre pisam primeiro com o pé direito no chão ao acordarem, eu desviava de pessoas para não ter de pedir desculpas - ou resmungos mal humorados. A cidade estava cada vez pior, ninguém sequer esboçava olhar para mim, era como se todos estivesse atrasados, ou no mundo da lua.

Entrei no ônibus e, como de costume, estava lotado. Tive de ficar em pé, sem ao menos passar na roleta. Mais uma coisa estranha: ninguém bateu em mim, raspou em mim ou acertou uma bolsa ou mochila nas minhas costas. Que bom, apesar de ser ignorado até visualmente por todas as pessoas que cruzaram por mim, o dia estava sendo ótimo. Ah é, esqueci de escovar os dentes!

Apesar de quase ter sido jogado para fora do ônibus várias e várias vezes por freadas bruscas do motorista - ah, as pessoas que pedem para o ônibus parar quando ele está quase em cima da parada me... fazem sentir uma espécie de irritação que não sei definir - estava me sentindo muito bem, sem dores no corpo ou nos braços que tanto esforçavam-se para manter-me naquele ônibus. O dia estava lindo, o céu azul e algumas nuvens brancas me davam a certeza de que aquele inferno terrestre em nada se compara com a Natureza em sua essência absoluta.

Pedi para o cobrador, em tom de piada, se poderia sair pela frente - sem pagar. Ele olhou para o outro lado como se nada tivesse acontecido, como se ninguém houvesse falado consigo. Que... como é que se diz? Ah, deixa para lá. Enfim, até fui educado e perguntei se ele havia me ouvido mas... nada. Então olhei para o motorista e, após deixar um senhor de idade subir no ônibus, desci. A porta estava fechando, não sei como nem prendeu a minha mochila, ou a minha perna. Ah, esqueci a minha mochila?!

Estava perplexo porém, apesar de todas as estranhezas inconvencionais, estava alegre como um cachorro que acaba de ganhar um pedaço de carne. Ah, que fome! Parei em uma lanchonete e pedi um cardápio. Ninguém olhou para mim. Não havia ninguém mais na lanchonete e eles esnobavam um cliente? Agradeci - talvez ironicamente - a atenção e saí sem dizer mais nada.

Que estranho, as pessoas me ignoraram tantas vezes e ainda assim me sintia bem. Ah, a aula! Corri para não me atrasar e, numa daquelas coincidências que fazem pensar 'não precisava mesmo ter saído de casa', olhei para um recado na porta da sala que dizia que todos estavam de luto e que não haveria aula. Não havia nome nem local de enterro ou afim. Estranho, não consegui lembrar de alguém ter morrido, tomara que não tenha sido a Carol, aquela pessoa realmente fazia as aulas ficarem engraçadas.

Caminhei mais e mais, apreciando o lindo dia, percebendo um bem estar em mim que nunca havia tido. O problema é que a falta de olhares para mim, nem que por consideração ou intenção de criticar minha falta de arrumação, começava a incomodar. Na parada de ônibus não havia ninguém. Um ônibus se aproximou e, quando ainda estava a uma distância considerável, acenei para que parasse.

Ele não parou e ainda por cima quase passou por cima de mim, se não sou bem vivo teria sido atropelado por aquele sujeito... que estranho, não me lembrava mais como criticar uma pessoa assim. Nem como xingar. Lembro que fazia isso mas agora... o que estava acontecendo?

As horas foram passando e à pé cheguei em casa. A porta estava fechada. Bati mas pareceu que ninguém havia ouvido. Estranho, nem mesmo eu ouvi as batidas na porta. Tentei gritar mas... não ouvia a minha própria voz! Será que no ônibus e na lanchonete acontecera o mesmo? Estufei o peito e gritei o mais alto que pude porém era como se não houvesse ar, não houvesse voz.

Saí correndo em direção a... onde eu estava indo? Minhas pernas se moviam por conta, cada vez mais rápido, nada de sentir o vento, nada de ter de fechar os olhos, sequer piscava, nada de desviar de buracos ou parar para os carros passarem. Corria sem amanhã e... sem hoje.

Então parei. Se lágrimas pudessem sair de meus olhos, choraria naquele instante muito mais do que em toda a minha vida. Não sabia o que dizer - até porque mesmo que soubesse, nenhuma palavra ecoaria no espaço - nem o que pensar. Estava perplexo, ou melhor, não estava mais. Nada.

Eu não era mais eu, minha voz não ecoava e minha presença não era notada porque... eu não estava mais aqui. Não havia lágrimas, voz ou aparência, não havia nada além de...

Não havia nada.

Eu não estava em lugar algum mais, embora pudesse, naquele momento, ver que algumas pessoas lamentavam o que ocorrera. Achei que nem sabiam mais que eu... existia. No passado. Quando me dei conta, o céu azul tomou conta de tudo, para onde quer que olhasse via um azul bebê magnífico. Talvez estivesse lembrando da minha infância, dos meus pais, amigos, da Carol.

Entrei para algumas histórias como parte do passado. Nada que todos venham a se lembrar.

Era como se fosse novamente um bebê, nas Mãos...

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Não


Desconheço palavra que diga mais do que a mais simplória negação, o não. Ele é negativa em absoluto sem a mínima necessidade de explicação ou justificação. Há sim, a possibilidade de prolongá-lo - com uma explicação longa ou breve - ou fazer de conta que ele não é uma negação em si - com uma justificação. Possibilidade, não necessidade. Porque o não é não, resposta ou afirmação negativa.

Talvez contraditório. Talvez irônico. Talvez sarcástico. Nem sempre sincero. Doloroso - embora nem sempre - para quem ouve e/ou mesmo para quem diz.

Pode querer dizer muito ou pouco. Depende. De qualquer forma, é uma negação. Nem sempre clara, mas uma resposta.

Que geralmente vai contra uma vontade, uma intenção, ou alguma outra coisa e que, por isso, ninguém - ou quase - gosta de receber.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O vazio de viver e só (22)


Caminhei longos passos. Muitos passos. 

Por quase todos eles procurei uma música que pudesse encher meus ouvidos e, ao abafar meus pensamentos, trazer-me qualquer sensação que substituísse aquela momentânea.

Tantas foram os inícios de música que perdi as contas. Sinceramente, sequer comecei alguma contagem. 

Uma música começava e antes que pudesse desenvolver uma sonoridade clara, outra música começava.

Não era culpa de dedos inquietos, mania de mudança ou falta do que fazer.

Não havia culpa. Não há culpa.

Só não era de uma música em específico que eu precisava. Nenhuma música poderia transformar em sensação o que havia naqueles passos.

E o que há nesse silêncio.

Desisti de encontrar uma música, de trocá-las rapidamente para, de alguma forma, afastar a minha atenção.

Não é em uma música que está a sensação que eu procuro. Não é nas lágrimas ou nos sorrisos.

Há alguma coisa muito maior, que nenhuma sensação pode encobrir, disfarçar ou tomar a frente da minha vida.

Tampouco tem culpa, hoje, a sensação de incapacidade, de impossibilidade, de fracasso.

A série é longa, não seria hoje, justamente hoje, que tudo isso voltaria a representar algo.

Dizer que não sei ao certo o que aconteceu durante esses passos, naquela falsa busca por alívio através da música, seria mentir. Só que hoje acabei errando em pensar que poderia fazer com que não provocasse nada.

Não quero mais mentir. Cansei de mentir para mim com sensações, com teorias, com lembranças.

Isso pouco me alimenta.

Preciso de sentimentos.

*momento

domingo, 18 de setembro de 2011

Pedaços de um pensamento (26)


Vejo que hoje, e é bem provável que sempre, me falta capacidade de expressão, mesmo em situações corriqueiras. Deixando de escrever palavras um tanto figurativas posso dizer que me sinto, muitas vezes, um bobo por completo quando tenho a oportunidade e não sei expressar, palavras, gestos e, óbvio, sentimentos, às outras pessoas. Andando sozinho pelas ruas nas esquinas de qualquer lugar fica fácil 'pensar alto' - o que, em suma é o famoso falar de mim para comigo - e dizer que 'esse momento ao seu lado, por mais simples que possa ser, me faz acreditar que o sublime está sim em cada palavra, em cada gesto e em cada olhar seu'.

Isso em mim irrita a mim. Muito. Por que é tão fácil dizer que um momento é tão único quando não estou mais vivendo aquele momento? O inútil dom do arrependimento não corrige uma falha de personalidade que impede que demonstrações verdadeiras - e tão simples! - sejam levadas para fora de uma mente que não cansa de querer.

Além das palavras há a repressão - por assim dizer - do que está acontecendo dentro da mente, e à partir do coração. É um instinto humano que deve indicar algo como medo, receio ou ansiedade por desconhecer o que virá em contrapartida pelo gesto - ou palavra, demonstração. E se não consigo sorrir ou mesmo pronunciar frase qualquer não é porque aquele é um momento difícil e sim porque eu, dentre as muitas limitações, não consigo me soltar quando quero ser melhor, quando quero falar melhor, quando quero me expressar melhor.

Sublime. Em uma tarde de sábado, em alguns passos, um motivo que nunca muda.

Acima do incrível, do indescritível, do magnífico.

Ainda assim, tão somente sublime.

sábado, 17 de setembro de 2011

A porta


Eu já não aguentava mais ver aquela porta abrindo e fechando como se não houvesse um amanhã. Havia um amanhã para mim sim, embora aquela porta insistente lutasse incansavelmente para me fazer acreditar que não. Quanto mais pessoas entravam, mais pessoas saíam e essa troca estúpida de rostos não refletia em acréscimo, decréscimo, nada. Tudo permanecia a mesma coisa e aquela porta continuava a abrir-se e fechar-se transformando em impaciência toda a minha despreocupação temporal. Antes que me chamem de egoísta digo que entendo que aquilo precisa acontecer porque todos tem o mesmo direito mas... por que parecia que aquela porta estava rindo de mim?

Depois de algum tempo, comecei achar aquilo tudo muito irônico. Logo eu, paciente até com a falta de qualquer coisa de todas as outras pessoas, estava impaciente por parecer estar no mesmo lugar há horas, embora o movimento fosse retomado toda vez que aquela maldita porta se fechava. O problema maior foi quando uma menina e uma senhora atravessaram aquela porta, aberta, e entraram rindo.

Não sinto inveja da alegria alheia mas, não, era demais. Aquelas pessoas não deveriam ter motivos para sorrir. Não tinha motivos para sorrir e ninguém que já tivesse passado por aquela tábua de metal em movimento há horas também não tinha. Ninguém então, em sã consciência, deveria sorrir justamente, e aí entendi qual era a ironia, ao atravessar a porta que levava ao começo do fim da paciência, da tolerância e até mesmo da compreensão de que, assim como toda agonia, aquela que estava sendo causada por uma opaca porta de metal também teria um fim.

A impaciência acaba, a angústia, geralmente, também, a intolerância é um estado passageiro que desaparece com o tempo. Tempo que não parecia existir quando me via preso, amassado e em frangalhos, sufocado e ridicularizado por uma lata, velha. O egoísmo tem fim quando entendo que o sorriso das outras pessoas era o único sopro de vida em plenitude que poderia me acalmar naquele momento. Não adianta pensar nisso agora, mas é elogiável(mas não muito) o raciocínio.

Quanto ao fim disso... bom, quem se importa com o fim?

*Aliás, há muito tempo não sei o que é fim. 
A falta de um final aqui prova que não estou mentindo.