terça-feira, 27 de setembro de 2011

O vazio de viver e só (23)


Há algum tempo caminhava sobre uma linha de limite. Se passasse por ela, imaginava, estaria descendo ainda mais em um buraco de desilusões, tristezas, desamparo, desânimo e angústia. O temor de ir além de onde já estava, o que já é(era) muito, fazia com que cada detalhe que indicava a possibilidade da existência de um absoluto fim da esperança atordoasse cada escolha feita, cada palavra dita, cada desejo sonhado como se fosse o último. Entre tudo o que aconteceu - e não aconteceu - e tudo o que deixou de acontecer - e ainda assim aconteceu - havia alguns pontos de interrogação. Supus ter várias respostas porém, ironicamente, duvidava delas com intensa desilusão.

Durante esse tempo, respondi por outras pessoas a pergunta: "Você vê a mesma verdade que eu?" e, dificultando ainda mais a minha permanência na - já terrível - caminhada na linha de limite, o que obtive foram decepções. Não encontrar muitos 'sim' para uma pergunta que não saiu de minha cabeça poderia ser, então, o ponto limite nessa caminhada.

Há frases de desconhecidos que fizeram do hoje o ponto limite. Superei a linha que havia delimitado como limite de sanidade, possibilidade de sorriso e reconhecimento da vida como uma maravilha. Deveria, pelas suposições passadas, estar deitado no sofá pressionando uma almofada contra meu rosto - ou alguma atitude semelhante, igualmente idiota, desesperada e sem finalidade compensatória - na lamentação extrema proveniente da constatação de que, entre todos, estaria eu na pior das colocações - independentemente de qual lista estaríamos fazendo.

Escrevi em primeira pessoa para concluir, depois de pouca clareza, alguma subjetividade e nenhuma descrição clara, que, bom, mesmo ultrapassando um limite sob o qual acreditava estar caminhando - com um medo infantil de dar um passo adiante - não sinto a (ignorante) necessidade de tomar alguma atitude contra a minha mente, o meu corpo ou mesmo a minha alma. Também não me conformo com o popular 'a vida continua' pois, embora seja verdade, é conformista demais.

Paro e lamento, sofro com uma tristeza monumental entretanto, ironicamente ou não, agora sinto-me muito próximo de uma linha exponencial pela qual, provavelmente, caminharei para novidades. Não sou um vencedor por ter superado um limite (negativo) e ainda estar tranquilo. Se ainda conseguisse, talvez estivesse olhando para fora perguntando, para Céu e mundo, "por quê?".

Tudo isso é tão... estranho que não consigo direcionar as palavras para algum lugar. Elas estão aqui, comigo, apesar de tudo o que deveria levar-me a destruí-las na minha simples forma humana. Guardadas incondicionalmente aos pensamentos, aos limites e às novidades.

Guardadas pela eternidade limitada da minha vida humana.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Histórias de uma vida não vivida (39)


*Quando fecho os olhos posso sonhar sem qualquer tendência. Os olhos são impedidos de ver e as mais diversas sensações podem ser percebidas para, aí sim, transmitir ao sonho um aspecto imaginável, entretanto real. Realidade que foge do meu controle quando a minha imaginação, e com ela os meus desejos mais escondidos - e sinceros - vem à tona. Fujo da imagem que está ao meu alcance e me concentro na que longe de mim está. Pouco disso posso alcançar, quase nada terei comigo. Não me importo com isso, agora. Pois antes mesmo que feche os olhos, já começo a lembrar, a imaginar e, sem qualquer limite, a sonhar.

Ao acordar, hoje, estranhei ter dormido descoberto. A roupa de cama estava lisa como se ninguém passasse por ali há dias. Melhor para mim, pensei, pois não teria de arrumar. Meu colega de apartamento havia deixado a porta aberta, idiota! Aproveitei e, sem me arrumar, saí correndo pois estava atrasado. Quem se importa com a minha aparência? Os outros são os outros já cantou alguma voz brasileira.

Sempre tive, por hábito, desviar sempre que alguém pudesse bater em mim. Alguns não pisam em riscos ou divisórias no chão ou sempre pisam primeiro com o pé direito no chão ao acordarem, eu desviava de pessoas para não ter de pedir desculpas - ou resmungos mal humorados. A cidade estava cada vez pior, ninguém sequer esboçava olhar para mim, era como se todos estivesse atrasados, ou no mundo da lua.

Entrei no ônibus e, como de costume, estava lotado. Tive de ficar em pé, sem ao menos passar na roleta. Mais uma coisa estranha: ninguém bateu em mim, raspou em mim ou acertou uma bolsa ou mochila nas minhas costas. Que bom, apesar de ser ignorado até visualmente por todas as pessoas que cruzaram por mim, o dia estava sendo ótimo. Ah é, esqueci de escovar os dentes!

Apesar de quase ter sido jogado para fora do ônibus várias e várias vezes por freadas bruscas do motorista - ah, as pessoas que pedem para o ônibus parar quando ele está quase em cima da parada me... fazem sentir uma espécie de irritação que não sei definir - estava me sentindo muito bem, sem dores no corpo ou nos braços que tanto esforçavam-se para manter-me naquele ônibus. O dia estava lindo, o céu azul e algumas nuvens brancas me davam a certeza de que aquele inferno terrestre em nada se compara com a Natureza em sua essência absoluta.

Pedi para o cobrador, em tom de piada, se poderia sair pela frente - sem pagar. Ele olhou para o outro lado como se nada tivesse acontecido, como se ninguém houvesse falado consigo. Que... como é que se diz? Ah, deixa para lá. Enfim, até fui educado e perguntei se ele havia me ouvido mas... nada. Então olhei para o motorista e, após deixar um senhor de idade subir no ônibus, desci. A porta estava fechando, não sei como nem prendeu a minha mochila, ou a minha perna. Ah, esqueci a minha mochila?!

Estava perplexo porém, apesar de todas as estranhezas inconvencionais, estava alegre como um cachorro que acaba de ganhar um pedaço de carne. Ah, que fome! Parei em uma lanchonete e pedi um cardápio. Ninguém olhou para mim. Não havia ninguém mais na lanchonete e eles esnobavam um cliente? Agradeci - talvez ironicamente - a atenção e saí sem dizer mais nada.

Que estranho, as pessoas me ignoraram tantas vezes e ainda assim me sintia bem. Ah, a aula! Corri para não me atrasar e, numa daquelas coincidências que fazem pensar 'não precisava mesmo ter saído de casa', olhei para um recado na porta da sala que dizia que todos estavam de luto e que não haveria aula. Não havia nome nem local de enterro ou afim. Estranho, não consegui lembrar de alguém ter morrido, tomara que não tenha sido a Carol, aquela pessoa realmente fazia as aulas ficarem engraçadas.

Caminhei mais e mais, apreciando o lindo dia, percebendo um bem estar em mim que nunca havia tido. O problema é que a falta de olhares para mim, nem que por consideração ou intenção de criticar minha falta de arrumação, começava a incomodar. Na parada de ônibus não havia ninguém. Um ônibus se aproximou e, quando ainda estava a uma distância considerável, acenei para que parasse.

Ele não parou e ainda por cima quase passou por cima de mim, se não sou bem vivo teria sido atropelado por aquele sujeito... que estranho, não me lembrava mais como criticar uma pessoa assim. Nem como xingar. Lembro que fazia isso mas agora... o que estava acontecendo?

As horas foram passando e à pé cheguei em casa. A porta estava fechada. Bati mas pareceu que ninguém havia ouvido. Estranho, nem mesmo eu ouvi as batidas na porta. Tentei gritar mas... não ouvia a minha própria voz! Será que no ônibus e na lanchonete acontecera o mesmo? Estufei o peito e gritei o mais alto que pude porém era como se não houvesse ar, não houvesse voz.

Saí correndo em direção a... onde eu estava indo? Minhas pernas se moviam por conta, cada vez mais rápido, nada de sentir o vento, nada de ter de fechar os olhos, sequer piscava, nada de desviar de buracos ou parar para os carros passarem. Corria sem amanhã e... sem hoje.

Então parei. Se lágrimas pudessem sair de meus olhos, choraria naquele instante muito mais do que em toda a minha vida. Não sabia o que dizer - até porque mesmo que soubesse, nenhuma palavra ecoaria no espaço - nem o que pensar. Estava perplexo, ou melhor, não estava mais. Nada.

Eu não era mais eu, minha voz não ecoava e minha presença não era notada porque... eu não estava mais aqui. Não havia lágrimas, voz ou aparência, não havia nada além de...

Não havia nada.

Eu não estava em lugar algum mais, embora pudesse, naquele momento, ver que algumas pessoas lamentavam o que ocorrera. Achei que nem sabiam mais que eu... existia. No passado. Quando me dei conta, o céu azul tomou conta de tudo, para onde quer que olhasse via um azul bebê magnífico. Talvez estivesse lembrando da minha infância, dos meus pais, amigos, da Carol.

Entrei para algumas histórias como parte do passado. Nada que todos venham a se lembrar.

Era como se fosse novamente um bebê, nas Mãos...

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Não


Desconheço palavra que diga mais do que a mais simplória negação, o não. Ele é negativa em absoluto sem a mínima necessidade de explicação ou justificação. Há sim, a possibilidade de prolongá-lo - com uma explicação longa ou breve - ou fazer de conta que ele não é uma negação em si - com uma justificação. Possibilidade, não necessidade. Porque o não é não, resposta ou afirmação negativa.

Talvez contraditório. Talvez irônico. Talvez sarcástico. Nem sempre sincero. Doloroso - embora nem sempre - para quem ouve e/ou mesmo para quem diz.

Pode querer dizer muito ou pouco. Depende. De qualquer forma, é uma negação. Nem sempre clara, mas uma resposta.

Que geralmente vai contra uma vontade, uma intenção, ou alguma outra coisa e que, por isso, ninguém - ou quase - gosta de receber.

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O vazio de viver e só (22)


Caminhei longos passos. Muitos passos. 

Por quase todos eles procurei uma música que pudesse encher meus ouvidos e, ao abafar meus pensamentos, trazer-me qualquer sensação que substituísse aquela momentânea.

Tantas foram os inícios de música que perdi as contas. Sinceramente, sequer comecei alguma contagem. 

Uma música começava e antes que pudesse desenvolver uma sonoridade clara, outra música começava.

Não era culpa de dedos inquietos, mania de mudança ou falta do que fazer.

Não havia culpa. Não há culpa.

Só não era de uma música em específico que eu precisava. Nenhuma música poderia transformar em sensação o que havia naqueles passos.

E o que há nesse silêncio.

Desisti de encontrar uma música, de trocá-las rapidamente para, de alguma forma, afastar a minha atenção.

Não é em uma música que está a sensação que eu procuro. Não é nas lágrimas ou nos sorrisos.

Há alguma coisa muito maior, que nenhuma sensação pode encobrir, disfarçar ou tomar a frente da minha vida.

Tampouco tem culpa, hoje, a sensação de incapacidade, de impossibilidade, de fracasso.

A série é longa, não seria hoje, justamente hoje, que tudo isso voltaria a representar algo.

Dizer que não sei ao certo o que aconteceu durante esses passos, naquela falsa busca por alívio através da música, seria mentir. Só que hoje acabei errando em pensar que poderia fazer com que não provocasse nada.

Não quero mais mentir. Cansei de mentir para mim com sensações, com teorias, com lembranças.

Isso pouco me alimenta.

Preciso de sentimentos.

*momento

domingo, 18 de setembro de 2011

Pedaços de um pensamento (26)


Vejo que hoje, e é bem provável que sempre, me falta capacidade de expressão, mesmo em situações corriqueiras. Deixando de escrever palavras um tanto figurativas posso dizer que me sinto, muitas vezes, um bobo por completo quando tenho a oportunidade e não sei expressar, palavras, gestos e, óbvio, sentimentos, às outras pessoas. Andando sozinho pelas ruas nas esquinas de qualquer lugar fica fácil 'pensar alto' - o que, em suma é o famoso falar de mim para comigo - e dizer que 'esse momento ao seu lado, por mais simples que possa ser, me faz acreditar que o sublime está sim em cada palavra, em cada gesto e em cada olhar seu'.

Isso em mim irrita a mim. Muito. Por que é tão fácil dizer que um momento é tão único quando não estou mais vivendo aquele momento? O inútil dom do arrependimento não corrige uma falha de personalidade que impede que demonstrações verdadeiras - e tão simples! - sejam levadas para fora de uma mente que não cansa de querer.

Além das palavras há a repressão - por assim dizer - do que está acontecendo dentro da mente, e à partir do coração. É um instinto humano que deve indicar algo como medo, receio ou ansiedade por desconhecer o que virá em contrapartida pelo gesto - ou palavra, demonstração. E se não consigo sorrir ou mesmo pronunciar frase qualquer não é porque aquele é um momento difícil e sim porque eu, dentre as muitas limitações, não consigo me soltar quando quero ser melhor, quando quero falar melhor, quando quero me expressar melhor.

Sublime. Em uma tarde de sábado, em alguns passos, um motivo que nunca muda.

Acima do incrível, do indescritível, do magnífico.

Ainda assim, tão somente sublime.

sábado, 17 de setembro de 2011

A porta


Eu já não aguentava mais ver aquela porta abrindo e fechando como se não houvesse um amanhã. Havia um amanhã para mim sim, embora aquela porta insistente lutasse incansavelmente para me fazer acreditar que não. Quanto mais pessoas entravam, mais pessoas saíam e essa troca estúpida de rostos não refletia em acréscimo, decréscimo, nada. Tudo permanecia a mesma coisa e aquela porta continuava a abrir-se e fechar-se transformando em impaciência toda a minha despreocupação temporal. Antes que me chamem de egoísta digo que entendo que aquilo precisa acontecer porque todos tem o mesmo direito mas... por que parecia que aquela porta estava rindo de mim?

Depois de algum tempo, comecei achar aquilo tudo muito irônico. Logo eu, paciente até com a falta de qualquer coisa de todas as outras pessoas, estava impaciente por parecer estar no mesmo lugar há horas, embora o movimento fosse retomado toda vez que aquela maldita porta se fechava. O problema maior foi quando uma menina e uma senhora atravessaram aquela porta, aberta, e entraram rindo.

Não sinto inveja da alegria alheia mas, não, era demais. Aquelas pessoas não deveriam ter motivos para sorrir. Não tinha motivos para sorrir e ninguém que já tivesse passado por aquela tábua de metal em movimento há horas também não tinha. Ninguém então, em sã consciência, deveria sorrir justamente, e aí entendi qual era a ironia, ao atravessar a porta que levava ao começo do fim da paciência, da tolerância e até mesmo da compreensão de que, assim como toda agonia, aquela que estava sendo causada por uma opaca porta de metal também teria um fim.

A impaciência acaba, a angústia, geralmente, também, a intolerância é um estado passageiro que desaparece com o tempo. Tempo que não parecia existir quando me via preso, amassado e em frangalhos, sufocado e ridicularizado por uma lata, velha. O egoísmo tem fim quando entendo que o sorriso das outras pessoas era o único sopro de vida em plenitude que poderia me acalmar naquele momento. Não adianta pensar nisso agora, mas é elogiável(mas não muito) o raciocínio.

Quanto ao fim disso... bom, quem se importa com o fim?

*Aliás, há muito tempo não sei o que é fim. 
A falta de um final aqui prova que não estou mentindo.

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Histórias do Billi J. - Eu sou você amanhã (1)


- E aí seus medonhos! - disse, sorrindo, o Billi J..

Agora estavam todos reunidos. Todos os quatro, no caso.

- O que temos para hoje? - perguntou aos outros.

- Estou com fome.

Esse era o Rafael, pensando, quase sempre, nos prazeres básicos da vida, como comer.

- Eu também.

Luiz, vinte e dois anos de muitas bobagens feitas que demorou um pouco para perceber que amigos de verdade tinha poucos.
- Acho que todo mundo está com fome. Corremos que nem uns idiotas.

Palavras do Douglas, o mais velho. O mais experiente. O mais radical, irônico e despreocupado. E geralmente o menos empolgado com atividades físicas.

- Mas foi engraçado ao menos.

Esse, óbvio, era o Billi J. .

- Me lembre de cortar os pulsos antes de aceitar quase morrer correndo com vocês, de novo. - insistiu Douglas.

Todos riram.

- Então vamos comer logo que eu quero dormir cedo. - insistiu Rafael.

- Agora que você está solteiro não tem motivos para ir dormir cedo.

Todos riram.

- Mas o que vocês querem fazer, querem me levar para o mal caminho?

- Você já está no mal caminho, namorava a mulher que ama e agora está solteiro, quer caminho pior? - ninguém lembra quem disse isso.

- Diz o cara que esperou anos praticamente sozinho para namorar o tal 'amor da vida'.

Todos riram.

- Não fica tripudiando com quem está solteiro. - a voz da sabedoria do Luiz.

- Quando a Renata ainda tava bem longe vocês ficavam soltando piadinhas, rindo da minha cara e dizendo que eu, pai, só se adotasse uma criança, é a minha vingança.

Ninguém riu. 

O silêncio imperou. 

O clima pesou.

Eles se olharam.

Então riram.

- Terminar o namoro foi uma escolha sua, pelo que você disse.

- Ela era muito ciumenta, não podia sair com vocês que ela já perguntava onde íamos, como íamos, com quem íamos, quando voltaríamos, o que iríamos fazer.

-Todas nos enchem de perguntas.

- A toda hora, a toda ação e, se pudessem descobrir o que pensamos, nos fariam perguntas a cada pensamento.

- Não esqueça de cada olhar, você olha para o outro lado da rua procurando uma loja e elas já te cutucam perguntando por que você estava olhando para a bunda da atendente da farmácia. Detalhe: a atendente da farmácia estava dentro da farmácia, atrás do balcão e a única coisa que se podia ver da rua eram caixas de pasta de dente.

- Sério isso?

- Claro, fatos verídicos.

- Ei, o assunto é comigo, a reclamação é minha agora!

Todos riram.

- Fala então.

- Valeu Billi. Eu ia dizer que a Andresa era pior. Sempre achava que eu tava saindo com outra pessoa, que tava traindo ela. Três anos de namoro e não confiava em mim mesmo que eu nunca tenha dado motivos para ela desconfiar. Eu me sentia uma bosta de homem com isso.

- Você é um bostinha.

Todos riram.

- Rafa, claro que, também, dar carona para uma mulher que tem fama de garota de programa não tem nada a ver com o ciúmes da Andresa.

Todos riram.

- Douglas, você sabe que eu não fiz e nunca faria nada enquanto estivesse namorando né?

- Claro que não, só não quero falar de assuntos sérios enquanto estiver com a camisa molhada de suor e os pés cheios de lama.

- Vamos tomar banho e depois comer.

- E depois?

- Tem baile de formatura hoje, eu posso consegui ingressos.

- Claro Douglas, você conhece todo mundo nessa cidade, como não teria ingressos para uma simples formatura de... de que?

- Mas você é mesmo um grande filho da mãe, Douglas. Arruma um baile de formatura no dia do último capítulo da novela. Como que eu vou assistir o último capítulo da novela se tenho que ir no baile com vocês?
Todos riram, muito.

- Tá, é formatura de que curso?

- Sei lá, só sei que tem baile.

- Não tem muitas opções de curso nessa universidade medonha.
- É, são só sessenta e sete cursos, entre técnicos e superiores.

- Como você sabe?

- Li no panfleto que tá ali. - apontando o dedo para a parede.

Todos riram.

- Fechado então, vamos para o baile afogar as mágoas.

- Luiz, ainda guarda mágoas da Mari?

- Eu sempre guardo mágoas, de tudo e de todos.

Todos riram. Sabiam que ele estava brincando.

- E eu não estou brincando, guardo mágoas até de vocês.

E riram novamente. Ele estava sim apenas brincando.

- Estão achando que é brincadeira né?

E era.

- Então vamos logo que eu estou com fome.

Saíram.

(...)

sábado, 10 de setembro de 2011

Reflexões de um maluco (18)


Não quero que as situações sejam mais simples ou mais fáceis. Quero apenas que as situações sejam.

É bem fácil entender como acontece. Definir como montanha russa é precarizar, e até omitir, as consequências. Ao contrário da montanha russa - sobe, desce e, a menos que um idiota não tenha consertado uma parte estragada em potencial, nada acontece com a estrutura, nada acontece com os passageiros, exceto o medo, a adrenalina e a tola sensação de 'bah, é uma coisa indescritível', que não passa de bobagem - o efeito não estudado, sem nome ou definição, de um dia a dia com hifens obscuros pode trazer consigo efeitos catastróficos em algum ponto específico - ou na parte pelo todo, como gostam os poetas. 

Fácil é entristecer quem está alegre, derrubar quem está de pé e fazer cair quem nunca caiu. A semelhança dessas falsas diferenças com o efeito do dia a dia, seja ele 'culpa' do que chamam de 'a vida', 'o mundo', 'o tempo', 'a sociedade' ou - aquele que é mais patético - 'o universo', bem, essa semelhança é, como posso dizer sem parecer um anormal..., uma quase igualdade.

Aí você lê uma, duas ou três vezes e não entende o que está acontecendo, sobre o que estou escrevendo ou mesmo o que se sente quando se anda em uma montanha russa. Tudo bem, não precisa de nada disso agora.
Talvez agora sim.

A exaustão que uma rotina preenchida quase que por completo é um catalisador - ou seja, um agente que acelera algum efeito - para essa sensação de 'sobe e desce' do dia a dia. Esse 'bum' - como gostam de mencionar os psicólogos - psicológico(!) pelo qual passam 'os jovens' também acelera esses efeitos de alegria e tristeza quase misturadas, felicidade e decepção, lamentação e êxtase.

Mas o problema não é a 'fase', nem é 'coisa da idade' ou alguma coisa semelhante. O tal 'universo' que conspira contra todos aqueles que pensam na vida como um todo, e não apenas ao redor do próprio umbigo, bem esse 'universo' - para os que acreditam nele como causador da realidade - joga para baixo tudo o que está em cima, começa a subir e tem potencial para ser estrela, e não apenas faísca de bombril.

Se alguém tem um intelecto tão perturbado quanto o meu pode perguntar(mentalmente e nos comentários): Por que esse sujeito não é mais óbvio? Por que ele não tem capacidade?

Aí eu olho para você e respondo(mentalmente e quem sabe em um futuro "texto"): Capacidade de ser objetivo eu tenho, só não vejo moral em escrever duas frases quando posso escrever trinta e duas vezes treze.

É claro que eu poderia dizer que, seja 'a vida', 'o mundo' ou 'o universo' tem a incrível capacidade de trazer qualquer sensação ou sentimento ruim, como raiva, tristeza, decepção, mágoa ou afins, após - e não apenas após - momentos de espontâneos sorrisos e olhos fechados por lembranças boas. Se consegue(sempre) entristecer quem está feliz, por que não fazer o contrário e alegrar quem está deprimido?

Bife sem batata frita, um cônjuge amar pelos dois, segredo de duas pessoas guardado apenas por uma, e por aí vai. Falta uma metade, falta um pedaço, falta a outra parte, o complemento, o que junto faz ter sentido. Se derruba, como a lei da gravidade, que levante, como... um pai que joga o filho para cima dos ombros e o segura lá até que este tenha se cansado.

Cadê a outra metade do dia a dia? Será que isso acontece porque não coloco mais hifens? Ou é porque penso nessa 'existência'(?) que ela 'existe'(??) mesmo? Por que não existe uma 'gravidade' do 'universo' que empurre o que está no fundo, para cima, e faça com o que está caído levante?

Chega, antes que a criança canse dos ombros do pai e o texto perca todo o sentido.

*Eu não estou de mal com a vida, mau humorado ou quase no nível de 'espicaçar os rins'. Não estou sequer reclamando da 'vida', do 'mundo' ou do patético 'universo'. Apenas precisei escrever para demonstrar que tenho a leve impressão que os meus esporádicos, e isolados, momentos de felicidade estão sendo perseguidos, caçados, ameaçados e, sempre, arrebentados por alguma coisa, à qual a maioria dá o nome de 'a vida', 'o mundo' ou ainda 'o universo'.
Talvez seja só impressão. A sensação de esquecimento alheio e algo mais seja apenas uma semente para mais uma grande dose(quase inesgotável) de crescimento(improdutivo).

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Pedaços de um pensamento (25)


Hoje acordei com vontade de dizer que me cansei do silêncio e que um grito não à toa seria fundamental para dar sentido a um dia que ainda não tinha começado de fato. Pensei bem, fiquei calado e por um longo tempo permaneci assim.

As gotas escorriam pelo vidro embaçado, os raios solares lá fora pouco conseguiam fazer com que franzisse minhas sobrancelhas. Escrever sobrancelhas é estranho, isso está certo?

Não pensei em palavras, não pensei em imagens, não imaginei estar escrevendo quando voltasse. Horas e horas depois aqui estou, quase saindo novamente para a parte final de uma rotina habitual que não traz alegria e nem sentimento de que tudo vale à pena, de que isso faz crescer, que é aprendizado para a vida e todas aquelas bobagens motivacionais de quem te conhece e acha que sabe como é viver de um jeito em que nunca viveram.

E não viverão em suas fases mais propícias a oscilações. Quaisquer oscilações.

Que não seja entendido aqui que ninguém sabe o que está acontecendo, que ninguém pode ajudar ou qualquer outro blá blá do qual usufruí algum dia para reclamar e esbravejar, sem finalidade inteligente, de um momento que parece demorar mais do que deveria.

Quando as gotículas da madrugada começam a escorrer no vidro pela manhã pode-se ter a sensação de que não haverá mais obstáculo para os olhos. Eles continuam em sua rotina de dor e não permitem que qualquer visão seja aproveitada. No fim, aquele embaçamento todo do vidro é uma desculpa para desviar o foco das palavras que não disse, do grito que meus pulmões não berraram e da mensagem que ficou na intenção.

Tão somente intenção.

Nada aconteceu porque nada fiz porém nada aconteceria mesmo que fizesse algo. Escrever, dizer, enviar ou apenas imaginar, nada disso fará com que tudo que é escrito possa ser tornado depoimento pessoal, palavras de quem não apenas sente, não apenas pensa, não apenas imagina. Mas sim, vive.

Seria contra alguma lamentação uma possível revolta, quem sabe uma luta, entretanto, não há razão para lamentos.

Aliás, não há razão.

Depois de deixar de lado sonhos, quem sabe sentimentos, deixar de lado razões é abdicar de quase tudo por... pelo que mesmo? 

Ah sim, pelas respostas de todas as perguntas que há meses atormentam.

Infelizmente ninguém sabe onde estão as respostas.

*Quanto às gotas no vidro, bom, elas desapareceram.

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Pedaços de um pensamento (24)


Toda vez que me deparo com imagens volto ao terror da incapacidade. Não posso fazer qualquer analogia ou tentar desviar da realidade pois não consigo pensar em algo sequer parecido. É possível que só reste, agora, aceitar e conviver com a ideia de que não é possível voltar à vida normal, voltar a um estado anterior, tal qual se faz com um computador. São muitos nãos e todos impossibilitam a simples reação indiferente ao monstro, em tamanho e intensidade, que algum dia aquilo... foi?

Difícil.

Sinto-me exausto pela rotina, pelo meu tempo que não tem liberdade e sentir uma pontinha... mentira, quase um iceberg, de 'quem dera fosse eu' não ajuda a descansar, não ajuda a tranquilizar, a dormir em paz como se a vida fosse linear e o que passou, passou.

Poderia me precipitar em dizer que é impossível, poderia acertar em cheio e evitar que um novo e longo tempo viesse para me mostrar algum dia isso, jogando para mim a responsabilidade de assumir a culpa por tanto tempo perdido.

Perdido?

Não, disso eu tenho certeza, hoje, porque não há mais espera, não há mais imaginação, não há mais vontade. Falando em um nível racional, naturalmente. Porque foram tantas as vezes em que o objetivo, de não ter qualquer sensação afetando o comportamento, não foi alcançado que sei até onde o tempo permite ir, até onde a razão bloqueia o espontâneo da natureza e até onde eu consigo entender que tudo isso, agora sim, é normal.

Tenho pouco tempo para pensar, quanto mais escrever. As atividades que começam às 7 e 30 de manhãs frias e terminam depois das 22 e 30 de noites frias, com poucas e curtas interrupções, impedem que eu possa parar, pensar no tempo e dizer, para quem quer que seja, "então será assim".
Novas escolhas, opcionais ou impostas por qualquer tempo ou destino, surgem e poucas delas conseguem me fazer sequer pensar em uma nova rota para fugir de um marasmo no qual continuo afogado, agora sem tempo para respirar, embora não me impeça os movimentos como fazia há tempos.

Você não vai entender. Ninguém vai entender.

De simples, sinto saudade de grande parte daqulo que não quero deixar apenas no passado. Se não consigo voltar a uma normalidade que, vejo hoje nunca ter existido, por que não criar uma normalidade, agora?

Sem indiferença ou fingimento. Tudo, tudo mesmo, pode mexer de algum jeito comigo. Isso não impede mais de ver, e algum dia viver, aquilo de outra forma.

Não menos sincera.

*e pensar que esse pensamento todo veio sob forte e congelante vento, há pouco mais de 20 minutos. Enquanto caminhava, tentei analisar carros e pessoas que transitavam ao meu redor, pelas, ruas, calçadas, escadas e mesmo sacadas dos apartamentos. Fracassei como analista de trânsito porém, ao mudar o ângulo de visão e associar a esse um documentário visto durante a infância, consegui entender que muito mais do que naquela situação, poderia ver outra, e outras tantas, com olhos muito menos próximos.