terça-feira, 21 de abril de 2009

Histórias de uma vida não vivida(9)

Acústicos e Valvulados - Imaginação

*Olhos que não veem. Ouvidos que não ouvem. Boca que não fala. Coração que não sente. Mãos atadas sem corda ou barbante. Pés enterrados mas que ainda conseguem caminhar. Mente trancada para tudo e para todos. O hoje que seria amanhã já é ontem e nada do que seria futuro virou presente e sequer passado.


Seus últimos muitos anos, que são quase todos os seus anos, foram feitos por uma rotina. Seguida à risca. Dia que outro algo acontece de extraordinário nessa rotina, mas muito normal se comparado a algo extraordinário de fato. Suas horas eram contadas, suas ações eram contadas. Contadas, vistas, feitas, refeitas e repetidas, mental e oralmente.

Os dias demoravam a passar. Seus sonhos se foram. Desiludido. Desesperado. Deprimente. Depressivo. Uma pessoa que se sente só passaria vergonha ao perceber a solidão deste, cujo coração só serve para bombear sangue para o corpo. Sentimentos não possui mais. Nada de amigos, nada de amor, nada de sequer alegria. Seus sorrisos eram parciais, sem profundidade sentimental alguma. Suas comemorações eram por motivos bobos, por coisas da rotina. Mas tudo indica que só comemorava para ironizar sua própria vida, e assim, ter um motivo para sair da sua tediosa rotina facial.

Pássaros voam, galos cantam, galinhas comem milho e vacas dão leite. Carros soltam fumaça, fazem poeira e ninguém existia além dele no mundo. Não pagava contas, não depositava dinheiro no banco, não entrava em contato com as pessoas. Nunca amou. Nunca teve a oportunidade de amar. Mas não fora somente aquela decepção que o fizera fugir de um mundo que jamais o quis.

Sozinho. Ele e a natureza em suas mais diversificadas formas, vegetais, minerais e animais. Sozinho ele sequer pensava no mundo. Nas pessoas. Nas coisas da vida. Em algo. Pensava na sua rotina. No seu dia. Nos seus afazeres. Que variavam conforme os meses do ano, mas sempre seguindo uma rotina anual. Nada fugia do contexto. Para alguns seria bom entretanto, para ele, era terrível. Tinha medo de mudar, de sair por aí e fazer o que queria.

Talvez porque não quisesse mais nada além de ficar no seu canto, sozinho, para o resto da sua vida. Uma vida que ele sabia nunca ter existido.

3 comentários:

O mundo no Instam!! disse...

è isso ai mesmo.. falou tudo
beijos estalados!

Anônimo disse...

adorei a descrição. o modo o jeito.
embora no meu intimo quisesse ter o dom de me aplicar a uma rotina em determinadas horas ... não invejo quem consegue.

Unknown disse...

a rotina é uma merda..

:p