quarta-feira, 23 de março de 2011

Histórias do Bandiolo - Ah sim, você( Ato VII )


( uma linha de poucos pontos faz a ligação entre o que é palavra e o que é real. Há pensamento em diversos pontos, há sentimento em apenas um )

Ato VII

Cena I

( Michelle encontra com o jovem rapaz )
- Boa tarde rapaz com tantas primaveras quanto eu, vi que estavas caminhando com o menino cujo rosto está sujo pelo mundo.

- Sim, estávamos conversando. Em hora futura estaremos conversando com um senhor a fim de tentarmos entender a relação de tempo e vida com o mais belo e indefinido dos sentimentos.

- Não entenderão, com conselhos de um velho ou de um recém nascido, o amor não pode ser segurado nas mãos e analisado com os olhos, apenas senti-lo basta.

- O dizes pois não queres reduzir sofrimento por ele, se o quisesses, iria conosco ao encontro do velho.

- E credes mesmo que ele lhe dará uma resposta definitiva?

- Se fosse esta possibilidade uma certeza, seria passado, pois já teria ouvido-o muito antes de nascer.

- Façam como queiram.

- O menino me contou que deste a ele uma cesta com morangos, que intenções tens com este gesto?

- Morreria de desgosto minha generosidade se houvesse intenção secundária em minha doação a um necessidado.

- Tua face está corada agora que mencionei-o diretamente, acaso teu coração estaria criando ligação com aquele menino que pouco tem por fora mas muito haverá de ter dentro?

- Meu coração é livre, voa com meus sonhos por meus pensamentos. Não há ligação, não há qualquer intenção, nada além de um gesto nobre que faço por...

- ...por?

- Eu o faço por algum motivo nobre, tenhas certeza disso.

- Não há razão na terra e muito menos nos mares e nos céus para que mintas para mim, vejo muito mais em teus incontroláveis gestos corporais do que tuas finitas palavras querem me dizer.

- Se vês o que realmente sinto, por que insistes com palavras?

- Não mais insistirei. Apenas estranho como podes ter por alguém aparentemente tão fechado e duro um sentimento tão espontâneo como tuas mãos inquietas e teus olhos brilhantes demonstram.

- Disse-te antes que o amor não pode ser entendido, uma vez que é livre, é independente, é puro e, como disseste, é espontâneo. Vejo naqueles olhos tristes um ser magnífico camuflado em poeira, roupas rasgadas, pés descalços e muitas barreiras passadas ainda intactas.

- Não estás longe da verdade. O tempo de meu relógio já é curto, preciso ir.

- Está bem, pode dizer-lhe por ti um recado meu?

- Dificuldade alguma encontrarei para tal.

- Obrigado. Diga-lhe que assim como ele tem dores passadas, todos temos, e que há o amor que recebemos pode derrubá-las se lhe dermos espaço...

-... e tempo.

- Isso, como soube que não seria outra minha palavra?

- Apenas soube. No mais, é uma bonita frase, terei orgulho em passá-la adiante.

- Obrigado.

(saem)

Cena II

( o velho senhor caminha pelo bosque até que encosta suas mãos em uma árvore )

- Minhas horas futuras não serão muitas, bem sei disso. Meu coração bate apenas pela esperança de vê-la novamente. Teria um fim digno se ao menos soubesse que, depois de todos esses anos, foste feliz e estiveste viva, e bem. Tão pouco, tão pouco e nada ligado a mim a não ser por uma lembrança que remete toda motivação de uma vida por um sentimento que, Deus bem sabe, não faz sentido. Tantas outras vieram e nenhuma conseguiu ser realmente um amor. Talvez tenha sido exigente mas a verdade absoluta é que em todas eu esperei sentir o mesmo que por ti, encontrar-te de alguma maneira. Felizmente não fui covarde de permitir tamanho sofrimento para com aquelas que tentaram ser novo amor em meu coração. Não seria justo ligá-las a mim sem verdadeiramente amá-las. Minha dor é amenizada por essa consciência que, mesmo tanto tempo depois, continua leve, com erros tão próprios quanto insignificantes ao mundo. Não tenho mais forças, preciso descansar um pouco.

( o senhor senta ao pé da árvore e dorme )

( fim do Ato VII )

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