terça-feira, 11 de dezembro de 2012

Pedaços de um pensamento (64)


Disse-me alguém, em um dia que tentarei esquecer depois disso, que "você pode colocar um jaleco em um jumento que ele nunca será um médico, ou enfermeiro, ou dentista. Será sempre um jumento". À princípio, levado pelo impulso de sensos nobres, inocentes, puros, coloquei-me contra isso, para situações reais que originaram essa analogia. É claro que não acho que um jumento vestindo jaleco algum dia será um médico, que isso fique bem explícito, também. A frase veio para figurar algo que... ah, se veio figurar é óbvio que era algo real.

No entanto, a frase não foi bem essa. Embora o dia eu comece a querer esquecer, sim.

A frase, entretanto, torna-se verdadeira para uma enormidade de coisas. De situações. E, claro, de pessoas. Jamais será regra - e Deus é muito bom por impedir que isso torne-se regra - apesar de já ser quase maioria.

Enquanto alguns poucos, como eu, tentam encontrar a novidade à partir do reencontro com a essência, outros insistem em mudar o bar, mas não a bebida. Mudar o desenho da roupa e não o que ela representa. Mudar as escolhas, sempre escolhendo a mesma coisa.

Só que em tempo diferente. Por razões diferentes. Acreditando que a diferença no ponteiro do relógio vai fazer alguma diferença na escolha em si, que é sempre a mesma.

Agora você entende por que o jaleco no burro, certo?

É sempre a mesma escolha, sempre uma nova esperança de que tudo mude por novos - supostos - motivos que, no final das contas, são sempre a mesma maçã, podre de tanto ser apalpada pela mesma pessoa na feira. Ou... chega de exemplos.

Você pode tentar mil vezes atirar uma pedra para cima e esperar que ela não desça. Ela sempre descerá. É lei da existência física dos corpos. Nada vai mudar isso.

Ou você pode fazer uma nova escolha, sem levar em conta as gotas doce do café amargo que, volta e meia - quase sempre - fazem-lhe beber sempre a mesma porcaria de café amargo, frio e que só te dá dor de barriga.

Por gotas de adoçante você beberia um café amargo, horrível? Vale tanto a pena assim essa sensação, curta e momentânea, de que é o melhor café do mundo, quando bem sabemos - sim, todos sabemos - que essa sensação não é nada se comparada com todo o resto, que por si só é uma porcaria?

Vale mesmo?

Eu acho que não. E não sou burro ao ponto de tomar sempre a mesma porcaria só por achar bom o gosto das três ou quatro gotas de adoçante daquele troço amargo e frio que você insiste em chamar de bom café.

Adoçante no café amargo, jaleco no burro, enfim, não dá para ser mais claro do que isso.

Certas coisas não mudam mas, quando são escolhas, são livres. Porque há liberdade para todos aqueles que querem deixar de lado o vício e recomeçar.

Apesar de não acreditar muito, ao menos não com tanto quanto antes, em abandono de vícios e mesmos erros, ainda insisto em pensar que é possível, sim, voltar-se à Verdade, buscar a essência e encontrar a si, pura e simplesmente.

É preciso querer. Ter coragem. E lutar.

Sem recair nas gotas de adoçante.

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