domingo, 18 de abril de 2010

No fundo do poço. Ou do prato.


Hoje, durante o meu singelo almoço, senti pena do arroz. É, do arroz. Aquele grão branco que é comido aos montes em vários almoços, de várias pessoas, com vários acompanhamentos. E é visto de muitos que o arroz, com raras exceções, nunca é prato principal. Ou é a feijoada, ou é a carne, a massa, o purê e até a salada(!). Tudo isso fica à frente do arroz no prato. Não que você coma o arroz por último ou não goste de arroz. Mas a preferência no prato é da outra comida. O arroz é acompanhante, secundário. Entende?

Por isso tenho pena do arroz. Porque ele é apenas acompanhamento. É apenas complemento. É secundário. É deixado de lado nos restaurantes, perdendo de colherada para lasanhas, massas e afins. Insisto, até para as saladas o arroz perde. Até delas o arroz é coadjuvante. E você aí acha que o arroz gosta de ser assim? Gosta de ser deixado de lado até mesmo para saladas? Você acha que o arroz não gostaria de um lugar melhor para ver os noivos entrando nos carros após o casamento, um lugar que não fosse um chão sujo? Você não acha que o arroz é digno de pena? Se não, então acabe por aqui, insensível!

O arroz é assim como o cara que vende amendoim em estádio. Se é que existem ainda os vendedores de amendoim. O arroz e o vendedor de amendoim são dois coitados. Alguém está com fome. Ele passa e vai vender, mas a pessoa diz 'ah, deixa pra depois, o vendedor de cachorro quente vem aí'. Mundo injusto, mundo cruel. E o vendedor de amendoim continua carregando o peso totalitário de sua carga de amendoins, salgados e doces, pois nada vende. 

Ninguém quer amendoim. 

E assim o vendedor de amendoim sofre. Porque o povo prefere cachorro quente, com sua salsicha incrementada com maionese e ketchup. Prefere algodão doce, pipoca, picolé, enfim, qualquer coisa que não seja amendoim. O amendoim e seu triste e sofredor vendedor sempre são preteridos. E após o jogo ele ainda espera que alguém vá e ao menos compre um saquinho, para comemorar ou como prêmio de consolação pela derrota. Mas não. E o vendedor volta para casa, triste, desolado, e com um fardo pesado de amendoins nas costas.

E o que dizer então dos dias em que chove um pouco, sai o sol por pouco tempo, fica nublado, depois o sol reaparece e então chove mais um pouco. Não necessariamente nessa ordem. Esses dias também são dignos de pena. Porque as pessoas gostam de dias ensolarados. Ou até de dias chuvosos. Não de meio termo. Não dos dois dias em um mesmo dia. Dias assim recebem a frase 'esse é um dia para ser esquecido' de tantas e tantas pessoas. Coitado. Ele não tem culpa. O dia não tem culpa de ser assim. Porque não pode chover ou sair sol em todos os lugares. Mas ainda assim ele é colocado como dia ruim, péssimo, e daí para baixo. Sempre preterido, jamais preferido. Mais um coitado.

Não quero nem pensar no que acontecerá o dia em que, em um dia desses citados acima, nublado com sol e chuva alternando momentos, um vendedor de amendoim chegar em casa e comer um prato apenas com arroz.

Não, eu não quero pensar.

*um texto real e literal, com muita subjetividade implícita. 
Um desabafo tão distante de raiva que talvez nem chegue a ser um desabafo. 
Enfim, uma crítica social e muito mais 
em um texto que aos olhos normais é bobo, besta, ou até coisa pior.
Talvez uma crônica. E apenas talvez.

8 comentários:

Unknown disse...

arroz são como pessoas..
sempre somos vistos como acompanhamento..

Mulher de 30 disse...

O arroz apesar de secundário é indispensável! Pense nisso...rs

vou te visitar aki sempre.

Jééh disse...

não gosto de amendoin, isso é fato. mas indepedentemente do venha no prato sempre como arroz e depedendo de quem é protagonista naquela refeição as vezes fico só o arroz mesmo ^^

Camila disse...

Ótima crônica!

Rebeca Postigo disse...

Hum...
Gosto da sua subjetividade...
Me fez pensar em algumas coisas...
Obrigada!!!

Bjs

Marina Lima disse...

Seu desabafo bem estruturado nessas palavras fazem pensar. Venho sempre te visitar.
Beijos!

Kílceli Muniz disse...

Nossa, que texto!!! Ameeei! ;)
Parabéns!!!

Érica Ferro disse...

Você me faz pensar em coisas que eu pensaria se não fosse a correria do dia-a-dia ou a acomodação que adotei como modo de vida.
Obrigada.

Ingeri toda a subjetividade das suas palavras e acho que as entendi.