quarta-feira, 4 de março de 2015

Histórias de uma vida não vivida (65)

*Estava andando sozinho quando encontrei alguém que poderia me acompanhar. Parado ali, ao seu lado, comecei a conversar mas, por algum motivo, o que era para ser uma conversa virou um interrogatório. As poucas coisas sobre mim que consegui falar, sem que ela fizesse alguma pergunta - tentando manter algo parecido, ao menos, com uma conversa - não recebiam seguimento, expressões ou comentários. Nada. Enquanto eu falava ela ouvia, parecia desinteressada. Enquanto perguntava, e ouvia respostas secas e curtas, ela insistia em olhar para os lados como se não quisesse estar ali. Ela estava ali quando cheguei então deveria ter alguma razão para tal. Não havia. Ela apenas estava ali, em um trecho do caminho em que eu jamais imaginei encontrar alguém. Ela era linda, como todas as solitárias que cruzaram meu caminho até hoje - na verdade foi apenas ela mas cem por cento de um é, ainda assim, a totalidade - porém não parecia estar feliz por estar ali. Não pedi que Alguém colocasse-a no meu caminho. Estava sozinho e assim poderia continuar. Estava caminhando sozinho, em silêncio, e poderia fazê-lo pelo resto da vida, embora não quisesse que assim fosse. Não havia desânimo na solidão mas a conversa, que virou interrogatório, deixou-me desanimado em algum momento. Não pela falta de interesse, pela indiferença ou pelo desdém e sim porque, e somente porque, ela estava ali, cruzando (ou melhor, parada no) meu caminho e isso não significava nada pois ela não queria ali estar. Senti uma pequena decepção, breve entretanto intensa, e entendi que era melhor seguir em frente, sozinho, em silêncio, como estava antes de encontrá-la. Ela ficou ali e duvido que, ao ver-me partir, sentiu algo. Talvez sequer tenha olhado para mim enquanto dela ganhava distância. Eu quis conhecer, quis deixar a solidão mas ela não. Talvez não estivesse só porém, se estava no meu caminho, o mais provável é que estivesse ali o tempo todo, desde o início dos tempos, esperando enfim que eu cruzasse por ali e a levasse para algum lugar. Qualquer lugar. No meu caminho. Qual seria a história dela, você me pergunta e respondo que não sei. De forma alguma e não há como saber. Ela nada quis falar. Quanto a mim, segui meu tortuoso e silencioso caminho, solitário como sempre estive. O entusiasmo que gerou decepção em algum momento desapareceu. Ainda penso nela, se está parada, ainda, naquele lugar. Se estava esperando alguém que não eu. Se ainda consegue lembrar que algum dia por seus olhos cruzei. Porém, é necessário dizer, já não significa nada. Andando ou parada ela perdeu a chance de seguir comigo, de escrever comigo uma história. Ou preferiu escolher a estagnação, se é que ainda está lá. Para onde quer que tenha ido, adeus, lembrança, não a quero mais comigo. Embora, sinceramente, gostaria de saber que está bem.

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